A DELAÇÃO CONTRA O MINISTRO DIAS TOFFOLI É NATIMORTA
O pedido de abertura de inquérito contra um ministro do Supremo
Tribunal Federal é coisa que se reveste da maior seriedade. Aliás, um pedido de investigação contra qualquer cidadão exige um mínimo de cuidado, ou, processualmente falando, ao menos indícios da autoria e uma prova da materialidade.
Mas aqui não estamos a tratar de um inquérito decorrente de uma investigação criminal, como é o corriqueiro na atividade policial. A investigação se dá por força — ou fraqueza — de uma colaboração premiada em que o delator é o ex-governador do Rio de Janeiro. O fato é que essa colaboração já teve problemas de rejeição e, agora, volta à baila com esse pedido de investigação em relação ao ministro Toffoli.
Alguns pontos devem pontuar esse pedido que, a nosso juízo, fere a lei que rege a colaboração premiada. Já de início se divulga que os fatos que podem dar origem a investigação do ministro seriam oriundos de supostos repasses de valores ao escritório de sua esposa. Ocorre que a Lei 12.850/13 refere, expressamente, que os anexos de colaboração serão mantidos em sigilo e esse será levantado somente quando houver o recebimento da denúncia. Havendo a quebra do sigilo — e, pelo detalhamento das notícias é o que parece ter ocorrido — já temos um problema que fulmina esse acordo de colaboração.
Superada essa questão, sobrepõe-se outra mais importante. A 2ª Turma do STF já havia, por maioria e antes da sanção do dito pacote anticrime, firmado posição no sentido de não receber as denúncias lastreadas única e exclusivamente na palavra do colaborador. Também firmou posição que colaborações cruzadas — entre dois colaboradores — ou dados de corroboração feitos por eles próprios desacompanhados de provas não se prestavam para deflagrar a persecução penal.
Com as alterações do pacote anticrime, a legislação brasileira veda expressamente o recebimento de denúncia fundada somente na palavra do colaborador, ou seja, não haverá persecução penal se a palavra do colaborador não se revestir de um mínimo arcabouço probatório. De outro lado, não se pode olvidar que a alteração legislativa em relação a colaboração premiada também passou a exigir um maior cuidado no momento de sua homologação.
Ainda que o juiz não faça parte do acordo, que é um negócio jurídico processual entre Estado de um lado e o colaborador de outro, defendemos que cabe ao juiz examinar se os anexos se revestem de um mínimo de dados de corroboração. Aliás, a própria lei refere que deverão ser indicadas as provas e os dados de corroboração, portanto, em não havendo isso a colaboração não deverá ser homologada. Ainda, faltando algum dado, é possível até mesmo a instrução para averiguação dos dados comprobatórios, por isso mesmo refiro que o juiz pode e deve verificar se os dados de corroboração se encontram presentes antes de homologá-la.
No caso concreto, do que se é conhecido, há notícia de que os fatos são imputados por, vejam só, ouvir dizer. Ora, não é e jamais poderá ser viável juridicamente que se inicie uma investigação contra um ministro da Suprema Corte unicamente com a palavra de um colaborador, sem, a princípio, qualquer lastro de comprovação ou dados de corroboração. Se o mais, que é o recebimento da denúncia, encontra impedimento legal quando fundado somente na palavra do colaborador, o mesmo de valer para o menos que é a abertura de uma investigação.
Como principiei nesse artigo, devemos ter cuidado com as investigações instauradas em face dos cidadãos sem o mínimo lastro probatório. Ademais, o cuidado deve ser redobrado quando se trata de pedido de investigação fundado na palavra do colaborador. O instituto da colaboração premiada já recebeu inúmeras críticas e seu amadurecimento somente será possível se ele ficar subordinado aos ditames legais. Sem isso, destruiremos o próprio instituto. Por tudo isso, a investigação em face do ministro Toffoli só poderá ter o caminho natural de arquivamento pelo STF.