BÔNUS PAGO A SERVIDORES DO INSS PARA ACELERAR ANÁLISE ESTÁ PROMOVENDO VERIFICAÇÕES ERRADAS
Foto: Pedro França/Agência Senado
No início do governo do presidente Jair Bolsonaro, foi criado um bônus para acelerar a conclusão de pedidos e investigações de irregularidades do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) . Mas, um relatório de auditoria da Controladoria-Geral da União (CGU), identificou que a iniciativa aumentou as análises deficientes e está causando prejuízos para os cidadãos e até para o próprio governo.
O documento foi tornado público na semana passada e foi elaborado a partir de uma análise do trabalho do órgão entre 2015 e o primeiro trimestre de 2020.
De acordo com o relatório, analistas deixam, por exemplo, de solicitar informações e documentos adicionais aos segurados, a fim de acelerar a tramitação e concluir os processos mais rapidamente para ganhar o bônus. Com isso, o processo pode ser concluído sem o atendimento de um pedido válido do cidadão.
BMOB
Criado em uma das primeiras medidas provisórias editados por Jair Bolsonaro, em janeiro de 2019, o Bônus de Desempenho Institucional por Análise de Benefícios com Indícios de Irregularidade do Monitoramento Operacional de Benefícios (BMOB), prevê o pagamento de um bônus financeiro aos analistas do INSS para cada processo analisado além da jornada regular de trabalho.
Na criação, o governo afirmou que a iniciativa era "como um instrumento de gestão para aumento da produtividade e para conciliar a necessidade de atenção do INSS com os processos concessórios e o combate a fraudes e irregularidades, aumentando a capacidade operacional da autarquia".
A intenção inicial do governo era que o BMOB durasse até o fim de 2020, mas o programa foi prorrogado até o fim de 2022.
Análises sem documentos suficientes
De acordo com o relatório, foram encontrados efeitos positivos do programa em termos de produtividade, com aumento no número de casos analisados e redução na fila de benefícios aguardando decisão.
Mas os auditores da CGU também estudaram amostras de processos anteriores ao programa, concluídos dentro do programa (e, portanto, gerando recebimento do bônus) e uma amostra específica, feita pelos dez servidores com maior produção dentro do programa. O resultado foi a identificação de problemas que, segundo a CGU, estão prejudicando os cidadãos.
Um deles é que mais da metade (55,1%) dos processos analisados dentro do programa de bônus precisaria de mais documentos ou informações dos interessados para uma análise adequada, mas a requisição não foi feita ao cidadão. Assim, corre-se o risco de que pedidos adequados acabem rejeitados e pedidos inadequados, concedidos.
O levantamento identificou que o percentual é ainda maior entre os dez servidores com maior produção dentro do programa, chegando a 59,55% dos casos analisados. Entre os processos concluídos regularmente pelos analistas — sem o recebimento do bônus — esse percentual é de 36,87%.
Segundo o relatório, a falta dessa solicitação contraria a lei e causa prejuízos aos interessados nos benefícios. Para os auditores, todos os percentuais verificados são elevados, mas o aumento dentro do programa indica um efeito negativo do bônus na análise.
"Os números anteriormente citados permitem identificar que a partir do BMOB houve um decréscimo nas iniciativas para sanear os processos, mediante a solicitação de outras informações necessárias aos requerentes, antes de emissão de posicionamento a respeito do direito ao benefício, o que pode ser justificado pelo interesse de conclusão do processo de forma célere", explicam eles.
Os problemas não se restringem, no entanto, aos casos em que deixaram de ser solicitadas mais informações.
"Mesmo nos casos em que foram feitas exigências aos requerentes, estas não foram integralmente satisfatórias em razão de problemas com a clareza, pertinência e suficiência das informações requeridas (...) tendo-se ainda se identificado, no mesmo universo amostral, inobservância quanto ao prazo para atendimento da exigência e casos de ausência da ciência ao interessado quanto às pendências, o que dificulta, alonga o prazo e/ou impossibilita que o requerente regularize seu processo", diz o documento.
O INSS se manifestou durante o próprio processo de auditoria e disse que há regras claras para os servidores sobre solicitarem informações aos cidadãos em caso de necessidade.
O órgão informou ainda à CGU ter criado e expandido um programa "cujo escopo é monitorar a qualidade da decisão nos requerimentos de benefícios administrados pelo INSS, de maneira a contribuir para a sua melhoria" e citou planejamentos para 2021 em relação a melhorias na gestão dos processos.
Para os auditores, as informações apresentadas pelo órgão trazem medidas que podem atender às recomendações, mas cujos efeitos ainda serão avaliados no futuro.