A TEORIA DO DESVIO PRODUTIVO NO DIREITO DO TRABALHO
Os ramos trabalhista e consumerista são abarcados por certa similitude. Afigura-se uma assimétrica relação entre os sujeitos de ambos, caracterizada pela hipossuficiência de uma das partes: trabalhador ou consumidor. A força empresarial, figurando sempre no centro das relações de trabalho e de consumo, toma os préstimos obreiros para entregar ao consumidor, destinatário final, seus produtos e/ou serviços, configurando-se diuturnamente uma relação diagonal inter partes.
Da diagonalização inerente aos ordenamentos é que surgiu, no Direito do Consumidor, a Teoria do Desvio Produtivo, capitaneada pelo ilustre advogado Marcos Dessaune, que se caracteriza por patente perda de tempo útil, vendo-se o consumidor compelido a "desperdiçar o seu tempo e desviar as suas competências — de uma atividade necessária ou por ele preferida — para tentar resolver um problema criado pelo fornecedor, a um custo de oportunidade indesejado, de natureza irrecuperável" [1].
Não se haveria de privar do resguardo jurisdicional o trabalhador, hipossuficiente na relação de trabalho, e, nessa toada, iniciou-se a aplicação da Teoria do Desvio Produtivo no ordenamento justrabalhista. Diferente não haveria de ser, pois o trabalhador, à mesma medida que o consumidor, é habitualmente lesado pelo negócio.
A Consolidação das Leis do Trabalho, em seu artigo 8º, logra possibilidade jurídica à plena aplicação da referida teoria no ramo laboral. Aplicá-la, destarte, é dar efetividade aos protetivos princípios de Direito do Trabalho, responsabilizando integralmente aqueles que, por ação ou omissão, violam direitos de outrem.
Toda a questão é envolta por forma compensatória, indenizatória. A citada teoria perfilha a indenização pela perda de tempo útil, e sua aplicação em relações jurídico-processuais trabalhistas é capaz de volver um processo, ou um pedido, à procedência.
Exemplificando, caso um trabalhador judicialize um litígio por não haver o empregador efetuado as devidas anotações em sua Carteira de Trabalho, e, dentre os pleitos, busque a indenização por danos morais por tal ato ilícito, o Tribunal Superior do Trabalho julgará improcedente o pedido, vez que seu entendimento pacífico é de que ausência de anotação, por si só, não é capaz de configurar lesão a direito ensejadora indenização. Aplicando-se ao mesmo caso, todavia, a Teoria do Desvio Produtivo, falar-se-ia em indenização, esteada no fato de ter o trabalhador que buscar o poder judiciário para findar problema ao qual não deu causa.
Há de se destacar que o Tribunal Superior do Trabalho, em recente decisão [2], datada de 24/5/2021, confirmou pela primeira vez a aplicação da Teoria do Desvio Produtivo no âmbito do Direito do Trabalho, dando eficácia a acórdão do Tribunal Regional do Trabalho da 17ª Região. A inovadora decisão traz ao ordenamento justrabalhista inconteste segurança jurídica, repetindo os passos do Superior Tribunal de Justiça, que também aplica a teoria em relações de consumo.
Compete-nos, por fim, analisar a natureza jurídica da indenização e do dano. Correntes pontuam ser um dano destacado do dano moral, específico e autônomo, existente no plano de ferir o tempo livre da pessoa. O Tribunal Superior do Trabalho, por outra via, perfilha entendimento diverso e expressamente reputa o dano como evidente mácula à moral do trabalhador.