MEDIAÇÃO GARANTE A DURAÇÃO RAZOÁVEL DO PROCESSO DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL
O processo de recuperação judicial, cujo marco regulatório é a Lei n° 11.101/2005, tem por objetivo viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica.
É o que determina o artigo 47 da lei recuperacional, também conhecido como o princípio da preservação da empresa, que possui fundamento constitucional, dado que a nossa Constituição Federal, ao regular a ordem econômica, impõe a observância dos postulados da função social da propriedade (artigo 170, inciso III).
O mesmo dispositivo constitucional estabelece o princípio da busca do pleno emprego (inciso VIII), o que só poderá ser atingido se as empresas forem preservadas.
Ainda, sob o viés constitucional, a nossa Carta Maior assegura a todos os litigantes a duração razoável do processo (artigo 5° inciso LXXVIII).
Mas como garantir a duração razoável do processo de recuperacional — a despeito da previsão contida no artigo 75, §1º da lei — quando o processo envolve diversos atores e a estrutura do Judiciário apresenta uma burocracia, não permitindo a celeridade, a economia e a efetividade do Direito tão almejados pela sociedade?
A mediação é a via ideal para aproximar credores e o devedor, por meio de um terceiro imparcial, facilitador do resgate do relacionamento da empresa com seus stakeholders.
A atuação do mediador identificará os interesses comuns entre devedor e credor, facilitando o diálogo, auxiliando na negociação, estimulando a criação de opções que possibilitem gerar uma nova situação que atenda quantitativa e qualitativamente aos interesses dos envolvidos.
A técnica da mediação no processo recuperacional deve representar uma diminuição do tempo de duração deste tipo de demanda, garantindo uma duração razoável do processo.
Deveras, na dicção da Lei n° 11.101/2005 o processo recuperacional deve durar, em média, três anos e meio, quando somados os prazos do stay (de 180 dias prorrogáveis) com o prazo previsto para designação da AGC (150 dias do deferimento), associado ao período dois anos para fiscalização judicial do cumprimento do plano.
Mas essa não é a realidade de muitos processos recuperacionais existentes no Brasil.
Pesquisa feita pela PUC-SP e pela Associação Brasileira de Jurimetria aponta que a média da duração de um processo de recuperação judicial [1], no Brasil, é de dez anos. É um prazo grande para a recuperação de um crédito.
Nesse compasso, a reforma da Lei n° 11.101/2005, ocorrida no final de 2020, trouxe, para o arcabouço legislativo a regulação da mediação e conciliação aos processos de recuperação judicial, podendo ocorrer de forma antecedente ou incidental.
O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) já vinha preconizando sobre o assunto, com a edição de duas recomendações: a primeira, de n° 56 [2], de 22/10/2019, aconselhando aos Tribunais de Justiça a promoção da especialização de varas e a criação de câmaras ou turmas especializadas em falência, recuperação judicial e outras matérias de Direito Empresarial; a segunda, de n° 71 [3], de 5/8/2020, dispondo sobre a criação do Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania (Cejusc Empresarial), fomentando o uso de métodos adequados de tratamento de conflitos de natureza empresarial.
Não é de hoje que o Poder Judiciário brasileiro se preocupa com o volume de demandas que possui, especialmente agravado pelos efeitos decorrentes da pandemia que assolou o mundo a partir do ano de 2020. O próprio presidente do Superior Tribunal de Justiça, ministro Humberto Martins, defende que a mediação é cada vez mais usada para resolver disputas complexas em andamento na corte, inclusive em sede de recuperação judicial [4].
De fato, a mediação constrói o consenso, diminui a assimetria de informações, auxiliando geração de soluções criativas com ganhos recíprocos, com cooperação, o que impinge uma maior segurança quanto ao cumprimento do resultado obtido.
Associando a mediação ao processo de recuperação judicial tem-se, por exemplo, a construção conjunta do plano de recuperação judicial, possibilitando o seu cumprimento com mais comprometimento, dado que atendeu às expectativas dos credores quanto às possibilidades do devedor.
A vantagem de se utilizar a mediação, em sede de recuperação judicial, não se restringe à fase de deliberação do plano de recuperação judicial, mas, também, após sua aprovação, quando do seu cumprimento, pois é possível que surjam novos problemas e possibilidades de sua resolução por meio da mencionada técnica, sendo muito benéfico para a coletividade de indivíduos envolvidos no processo.
Dessa forma, fazer constar uma cláusula compromissória de mediação no bojo do plano de recuperação judicial para a resolução de litígios futuros permite que sejam ofertadas melhores condições ao tratamento dos aspectos objetivos e subjetivos intrínsecos aos negócios jurídicos que decorram do plano de recuperação ou das relações entre os credores e destes com o devedor.
O artigo 3º da Lei nº 13.140/2015 dita que "pode ser objeto da mediação o conflito que verse sobre direitos disponíveis ou sobre direitos indisponíveis que admitam transação". Cristalino, portanto, que há uma infinidade de situações nas quais pode ser aplicada a mediação, especialmente no âmbito de Direito Empresarial.
De fato, a mediação é um bom remédio para garantir a duração razoável do processo recuperacional, pois a demora na tramitação da recuperação judicial pode ser muito prejudicial às empresas, que precisam economizar tempo e dinheiro.
Estimulemos, pois, o uso da mediação na recuperação judicial.