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A DEDUTIBILIDADE FISCAL DA PARTICIPAÇÃO NOS LUCROS PAGA A DIRETORES EMPREGADOS

A participação nos lucros e resultados (PLR) tornou-se um modelo de remuneração comum nas empresas, estando prevista no artigo 7º, inciso XI, e no artigo 218, §4º, da Constituição Federal e na Lei nº 10.101/2000.

Entre as disposições da Lei nº 10.101/2000, o artigo 3º, §1º, prevê que a pessoa jurídica poderá deduzir como despesa operacional as participações atribuídas aos empregados nos lucros ou resultados. Assim, a empresa pode abater, da base de cálculo do Imposto sobre a Renda de Pessoa Jurídica e da Contribuição Social Sobre o Lucro Líquido (IRPJ/CSLL), a integralidade das despesas de PLR pagas a colaboradores que possuem características inerentes à relação de emprego.

A despeito da clareza da norma, a Receita Federal do Brasil (RFB) vem lavrando diversos autos de infração contra as empresas para questionar a dedução fiscal de despesas de PLR, quando pagas a diretores empregados. Segundo a RFB, a PLR paga a diretores empregados não seria dedutível por força do artigo 45, §3º, da Lei nº 4.506/1964, o qual dispõe que são indedutíveis as participações no resultado atribuídas aos "dirigentes ou administradores da pessoa jurídica".

A RFB sustenta, portanto, que a disposição do artigo 3º, §1º, da Lei nº 10.101/2000 somente seria aplicada para empregados que não tenham cargos de administração ou gerência.

Entretanto, parece-nos que a posição da RFB não condiz com as determinações legais.

Em primeiro lugar, a dedução fiscal quanto à CSLL está plenamente assegurada, inclusive por conta de normas emitidas pela própria RFB: o item A.163 do Anexo I da IN RFB nº 1.700/2017 prevê, expressamente, que a obrigatoriedade de adição dos "valores de gratificações atribuídas a administradores" não se estende à CSLL.

Em relação ao IRPJ, é necessário ter em consideração que a Lei nº 10.101/2000 é uma norma editada para regular a PLR em sua integralidade, inclusive quanto aos efeitos tributários. Assim, se há incompatibilidade entre suas disposições e o artigo 45, §3º, da Lei nº 4.506/1964, deve-se reconhecer a revogação tácita do dispositivo mais antigo.

A proposição acima decorre da aplicação do §1º do artigo 2º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB). Esse dispositivo prevê que "(a) lei posterior revoga a anterior quando expressamente o declare, quando seja com ela incompatível ou quando regule inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior".

A possibilidade de dedução fiscal de PLR paga a diretores empregados é também uma decorrência lógica da aplicação de normas trabalhistas. Afinal, "empregado" é "aquele que presta serviço de natureza urbana ou rural à empresa, em caráter não eventual, sob sua subordinação e mediante remuneração, inclusive como diretor empregado" (artigo 11 da Lei nº 8.213/1991).

Dessa forma, estando presentes as características de uma relação de emprego, não há como afastar o status de "empregado" do colaborador, ainda que ele tenha a condição de diretor, executivo ou qualquer cargo de direção. Sendo a condição de "empregado" definida pela norma trabalhista, não cabe à RFB desconsiderar a natureza da relação estabelecida e reconhecida pela empresa e pelo empregado, com o intuito de negar a dedução fiscal da despesa.

Especificamente em relação à CSLL, o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), como não poderia deixar de ser, afastou as pretensões da RFB para reconhecer que, quanto a esse tributo, a discussão quanto à possível restrição de dedutibilidade não é sequer aplicável, já que a citada Lei nº 4.506/1964 refere-se exclusivamente ao IRPJ (e.g. Acórdãos nºs 9101-004.640, 1201-003.584, 1301-003.760, 1201-002.648).

Além disso, recentemente houve uma decisão bastante positiva das cortes administrativas estendendo os mesmos efeitos ao IRPJ: a 2ª Turma da Câmara Superior de Recursos Fiscais (CSRF) do Carf, por unanimidade, deu provimento ao recurso especial do contribuinte, reconhecendo a dedutibilidade, da base de cálculo do IRPJ, da PLR paga a diretores empregados (Acórdão nº 9202-009.801, de agosto de 2021).

Nos termos do voto do conselheiro relator, não seria possível afirmar que diretores seriam empregados apenas para fins trabalhistas (e não fiscais). Esse comportamento da RFB iria, segundo o conselheiro, contra o princípio do venire contra factum proprium, ou seja, representaria um comportamento contraditório e contrário à boa-fé.

Nesse contexto, seria equivocado sustentar a existência de relação de emprego entre a empresa e o empregado, mas não entre a empresa e o Fisco, até porque a mesma relação de emprego não afeta apenas a apuração do IRPJ/CSLL, mas também a apuração das contribuições previdenciárias.

Segundo definiu corretamente a CSRF, caberia à autoridade fiscal demonstrar que os diretores não cumpririam os requisitos da relação de emprego, em especial a subordinação. Dessa forma, somente poderia haver a glosa das despesas de PLR se comprovada a inexistência do vínculo empregatício, o que não ocorreu no caso.

A dedutibilidade da PLR para fins do IRPJ sempre foi um assunto controvertido, mas certamente o precedente recente da CSRF sinaliza uma consolidação da jurisprudência a favor dos contribuintes, o que, a nosso ver, condiz com o objetivo da Lei nº 10.101/2000 e com o propósito de estimular a criação de planos de PLR em benefício dos empregados.