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CONSIDERAÇÕES SOBRE A OBRIGATORIEDADE DA VACINAÇÃO DAS CRIANÇAS

Introdução
Em levantamento realizado recentemente, foi constatado que menos de 20% das crianças brasileiras entre cinco e 11 anos haviam recebido a vacinação contra a Covid-19 [1].

A referida realidade decorre, principalmente, de um temor das mães e dos pais em relação à possibilidade de a vacinação causar algum mal para suas filhas e filhos. Além disso, algumas pessoas entendem que possuem o direito de decidir se vacinam ou não as suas crianças.

A dúvida que surge é: as mães e os pais podem decidir se vacinam ou não suas filhas e filhos contra a Covid-19?

A resposta ao questionamento em testilha é o que se pretende analisar no presente artigo por meio de uma metodologia exploratória e explicativa.

1) A vacinação contra a Covid-19 para as crianças
No dia 14 de janeiro se iniciou a vacinação de crianças entre cinco e 11 anos no Brasil por meio do imunizante Pfizer [2], e no dia 20 a Anvisa autorizou a vacinação de crianças entre seis e 11 anos com o imunizante Coronavac [3].

O medo de vacinar os filhos decorre principalmente da informação no sentido de que as vacinas contra a Covid-19 seriam experimentais. Entretanto, a referida informação é falsa, é uma fake news, uma vez que todas as vacinas aplicadas no Brasil passaram pelas três fases obrigatórias de teste [4].

Em verdade, a vacinação é recomendada para as crianças tanto pela Organização Mundial da Saúde (OMS) [5] quanto pela Anvisa [6] como medida para combater a pandemia do novo coronavírus.

Dessa feita, tal como afirma a Fiocruz, a vacinação das crianças contra a Covid-19 é essencial tanto para evitar a morte de crianças quanto para potencialmente diminuir a transmissão do vírus [7].

Além disso, a morte de crianças por coronavírus é uma realidade e efetivamente aconteceu em grande número no Brasil [8], diferentemente de eventuais efeitos colaterais graves decorrentes da vacinação, que são extremamente raros [9].

Assim, urge a necessidade de vacinação de todas as crianças brasileiras entre cinco e 11 anos como medida necessária para combater o novo coronavírus.

2) A obrigação da vacinação das crianças
Muitas pessoas alegam que possuem o direito de escolher se vacinam ou não as suas filhas e os seus filhos, não podendo, segundo elas, o Estado intervir na referida opção.

Entretanto, de antemão é importante frisar que as mães e os pais não possuem um direito absoluto de tomar todas as decisões inerentes aos seus filhos. Por exemplo, não existe uma opção de educar ou não educar as crianças; não se pode optar por deixar uma criança sozinha em casa, nem mesmo andar no elevador sozinha; assim como não existe a possibilidade de educar uma criança por meio de palmadas ou qualquer outro tipo de agressão, ainda que leve [10].

Em relação especificamente ao recebimento de vacina, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) prevê:

"Artigo 14  O Sistema Único de Saúde promoverá programas de assistência médica e odontológica para a prevenção das enfermidades que ordinariamente afetam a população infantil, e campanhas de educação sanitária para pais, educadores e alunos.
§1º. É obrigatória a vacinação das crianças nos casos recomendados pelas autoridades sanitárias
(grifo do autor).

Assim, claro está que o ECA determina que a vacinação das crianças é obrigatória nos casos recomendados pelas autoridades competentes, como é o caso da vacinação para a Covid-19, tal como dito no tópico anterior.

Desse modo, a mãe e o pai que não vacinarem seus filhos estão sujeitos às penalidades legais, que podem ser desde a perda do poder familiar até a aplicação do artigo 249 do ECA, que prevê:

"Artigo 249  Descumprir, dolosa ou culposamente, os deveres inerentes ao poder familiar ou decorrente de tutela ou guarda, bem assim determinação da autoridade judiciária ou Conselho Tutelar:
Pena — multa de três a vinte salários de referência, aplicando-se o dobro em caso de reincidência".

Questão mais tormentosa se dá sobre a possibilidade ou não de uma criança ser impedida de estudar porque não tomou a vacina. No Rio de Janeiro, a questão está sendo discutida na Justiça Federal com decisão no primeiro grau dizendo que a criança não vacinada pode ser impedida de frequentar as aulas [11], e com decisão de segundo grau no sentido contrário [12].

Há de se reconhecer que uma criança ser impedida de frequentar as aulas porque não se vacinou gera para ela uma dupla punição: a de não se imunizar e a de não estudar. Por outro lado, existem as outras crianças que se vacinaram e vão acabar sendo mais expostas por causa de uma família que não cumpriu a sua obrigação legal.

Diante dessa dicotomia, nos parece que deve prevalecer a situação que mais se adeque ao interesse coletivo, qual seja: só permitir o ingresso na escola das crianças que estejam efetivamente imunizadas.

Conclusão
A pandemia não terminou, mas a vacinação de todas e de todos está muito perto de acontecer e isso depende no momento muito mais da população do que do poder público.

No Brasil, toda pessoa com mais de cinco anos pode se vacinar, mais que isso: toda pessoa com mais de cinco anos deve se vacinar, salvo se existir prescrição médica em sentido contrário.

Entretanto, milhares de pessoas ainda não se vacinaram e a porcentagem de não vacinados é ainda maior na faixa etária entre cinco e 11 anos.

Desse modo, claro está que muitas pessoas ainda possuem receio de vacinar suas filhas e seus filhos contra a Covid-19 em virtude de informações falsas que foram disseminadas. Entretanto, ao optarem pela não vacinação das suas crianças, as mães e os pais descumprem uma obrigação prevista no Estatuto da Criança e do Adolescente e podem vir a sofrer sanções administrativas, como multa e até mesmo perder a guarda da criança.

Além disso, ainda que não exista jurisprudência consolidada sobre o tema, levar uma criança não vacinada contra a Covid-19 para a escola é uma medida passível de gerar litígios entre as escolas e os familiares; entre os familiares dos vacinados e os familiares dos não vacinados; e até mesmo entre as próprias crianças, uma vez que as vacinadas podem não aceitar pacificamente o convívio com quem não se vacinou.

De qualquer forma, espera-se que a referida situação não seja resolvida por meio da aplicação de sanções ou de decisões judiciais, e, sim, a partir da consciência de todas e todos acerca da importância da vacinação como principal medida para salvar vidas e acabar com a pandemia.

Referências bibliográficas
https://agenciabrasil.ebc.com.br/saude/noticia/2021-09/anvisa-vacinas-em-uso-no-brasil-nao-sao-experimentais.

https://agenciabrasil.ebc.com.br/saude/noticia/2021-12/fiocruz-defende-importancia-de-vacinar-criancas-contra-covid-19.

https://www.bbc.com/portuguese/geral-59831314.

https://butantan.gov.br/noticias/covid-19-ja-matou-mais-de-1.400-criancas-de-zero-a-11-anos-no-brasil-e-deixou-outras-milhares-com-.

https://www.cnnbrasil.com.br/saude/conselho-da-oms-recomenda-vacina-pfizer-de-covid-19-para-criancas-de-5-a-11-anos/.

https://www.gazetadopovo.com.br/vida-e-cidadania/breves/trf-suspende-exigencia-de-passaporte-da-vacina-de-estudante-carioca/. Acesso em 15/2/2022.

https://g1.globo.com/saude/coronavirus/noticia/2022/02/07/menos-de-20percent-das-criancas-de-5-a-11-anos-no-brasil-se-vacinaram-contra-a-covid-19.ghtml.

https://www.gov.br/anvisa/pt-br/assuntos/noticias-anvisa/2021/anvisa-aprova-vacina-da-pfizer-contra-covid-para-criancas-de-5-a-11-anos.

https://oglobo.globo.com/rio/covid-19-justica-nega-pedido-de-mae-de-aluna-do-colegio-pedro-ii-para-que-filha-pudesse-ir-escola-sem-vacina-25387395. Acesso em 15/2/2022.

https://www.poder360.com.br/brasil/veja-imagens-do-inicio-da-vacinacao-infantil-pelo-brasil/.

https://saude.abril.com.br/medicina/anvisa-libera-coronavac-para-vacinar-criancas-a-partir-dos-6-anos/.

sequelas#:~:text=Isso%20porque%20o%20Brasil%20soma,pandemia%2C%20segundo%20o%20Minist%C3%A9rio%20da.

 

[9] Fonte: https://www.bbc.com/portuguese/geral-59831314. Acesso em 15/2/2022.

[10] Nesse sentido, a lei 13.010/2014, conhecida como Lei Menino Bernardo, alterou o ECA para expressamente prever: Art. 18-A. A criança e o adolescente têm o direito de ser educados e cuidados sem o uso de castigo físico ou de tratamento cruel ou degradante, como formas de correção, disciplina, educação ou qualquer outro pretexto, pelos pais, pelos integrantes da família ampliada, pelos responsáveis, pelos agentes públicos executores de medidas socioeducativas ou por qualquer pessoa encarregada de cuidar deles, tratá-los, educá-los ou protegê-los.