GILMAR MENDES: 20 ANOS DE SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
Tenho por Gilmar Mendes profunda admiração, além de uma grande amizade, que vem desde a década de 1980, quando ainda era procurador regional da República. Nosso primeiro encontro foi intermediado por meu filho Ives, seu amigo, que me levou, após uma palestra na UnB (Universidade de Brasília), a com ele almoçar no aeroporto de Brasília, pois seguiria, logo após, para São Paulo.
Já nele percebi seu talento e o vigor de suas posições doutrinárias, muitas delas decorrentes de sua inconteste admiração pelo Direito alemão. É, aliás, doutor pela Universidade de Münster, na Alemanha, defendendo tese sobre controle de constitucionalidade perante aquela tradicional instituição.
De lá para cá minha admiração só cresceu, nada obstante termos divergido em alguns pontos, embora com convergências incomensuravelmente maiores em outros.
Escrevemos livros e artigos juntos, proferimos conferências um ao lado do outro, participamos de bancas de doutoramento, tendo recebido o título de professor honoris causa de seu instituto, creio menos por antiguidade e merecimento e mais por amizade. Afinal, como dizia Francis Bacon, embora divida a tristeza e multiplique a alegria, ela nunca é imparcial.
Tal parcialidade, entretanto, nunca atingiu sua toga, tanto que, em alguns julgamentos em que sustentei perante a Suprema Corte, embora não tenha se declarado suspeito, sua isenção se mostrou inquestionável, já que votou contra minhas teses, tendo sido voto vencido em dois dos casos.
Gilmar é um jurista de convicções sólidas, de arguta argumentação para suas posições e de permanente inconformismo, nas coisas da República, quando entende que não vão bem. Com notável liderança em todas as áreas em que atuou e atua, é um gerador cultural constante de iniciativas, como, por exemplo, a bem sucedida criação do Instituto do Direito Público (IDP), hoje faculdade conceituadíssima na área de direito no Brasil e Portugal, onde mantém fecundo convênio com as universidades portuguesas e com seus maiores constitucionalistas.
Nossas pontuais divergências estão nas escolas doutrinárias que seguimos, já que sou um velho professor de quase 60 anos de magistério universitário e 87 de idade, que adota a vetusta tripartição de poderes montesquiana, com rígido regime de competências de atribuições e, quando pertinentes, legislativas. Ele, entretanto, navega por modernas teorias, como da jurisprudência constitucional, caracterizada pelo neoconstitucionalismo ou consequencialismo, em que uma flexibilização maior dos princípios permite, por vezes, a atuação nos vácuos legislativos ou a correção dos rumos do Executivo, na visão do julgador.
Como tais questões de nítida visibilidade política são mais evidentes que a esmagadora maioria das questões em que convergimos, muitos entendem que meus elogios ao seu conhecimento e cultura quando divergimos, são apenas para dar elegância e altura ao debate, quando, em verdade, são da mais monolítica convicção, por conhecê-lo há várias décadas.
É Gilmar um dos maiores constitucionalistas da atualidade e, nos seus 20 anos de magistratura no Supremo Tribunal Federal, ele que foi procurador da República, serviu, na Casa Civil, dois presidentes da República, e exerceu com talento o cargo de ministro-chefe da Advocacia-Geral da União, merece receber todos os encômios dos operadores do direito do Brasil, pelo muito que já fez pelo nosso, lembrando que alguns dos institutos mais relevantes da aplicabilidade constitucional foram de sua autoria ou iniciativa.
Parabéns, meu caro e querido amigo, por estes 20 anos bem vividos no Pretório Excelso.