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TJ-SP TRANCA INQUÉRITO POR ACESSO ILEGAL DA POLÍCIA A DADOS DO COAF

A possibilidade de o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) encaminhar, de ofício, dados coletados no âmbito de um procedimento administrativo fiscal, quando há indícios da prática de crimes, não autoriza a Polícia ou o Ministério Público a requisitar diretamente esses mesmos dados, sem autorização judicial.

Dollar Photo ClubTJ-SP tranca inquérito de lavagem por acesso ilegal da Polícia a dados do COAF

Com esse entendimento, a 14ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo determinou o trancamento de um inquérito policial por ausência de justa causa. Por maioria de votos, o colegiado decidiu pela nulidade de um relatório obtido pela Polícia junto ao Coaf, sem autorização judicial, e que deu início às investigações.

O inquérito foi instaurado para apurar suposto crime de lavagem de dinheiro. Segundo a defesa dos dois investigados, a Polícia acessou o sistema do Coaf sem autorização judicial, tornando a prova nula. O relator, desembargador Marco de Lorenzi, afirmou que Supremo Tribunal Federal, no RE 1.055.941, validou o compartilhamento de dados, sem autorização judicial, desde que seja por iniciativa do Coaf.

"Alude especificamente sobre a hipótese em que o COAF, na condição de órgão que recebe ocorrências de atividades suspeitas praticadas por pessoas jurídicas e físicas, identificadas na Lei 9.613/98, elabora os consequentes relatórios de inteligência e, conforme o caso, os encaminha, de ofício, à autoridade competente para a investigação criminal", disse o magistrado sobre a decisão do STF.

No mesmo julgamento, conforme Lorenzi, o Supremo fez poucas referências sobre o acesso direto aos dados sigilosos por iniciativa do Ministério Público ou da autoridade policial, sem intervenção judicial, "as quais são no sentido de sua ilegalidade". Segundo ele, o STF definiu, "ainda que de forma sucinta", que o MP ou a Polícia não podem requisitar diretamente ao COAF informações protegidas por sigilo fiscal.

"Outrossim, o Colendo Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do RHC 83.233 e do RHC 83.447, ambos de relatoria do Eminente Ministro Relator Sebastião Reis Júnior, decidiu pela necessidade de prévia autorização judicial para validar o requerimento de dados de sigilo bancário e fiscal aos órgãos de inteligência", acrescentou.

Dessa forma, a conclusão de Lorenzi foi de que os órgãos de persecução penal não podem requisitar diretamente ao COAF dados bancários ou fiscais sigilosos, sendo imprescindível, para o compartilhamento de tais informações, prévia autorização judicial. No caso dos autos, documentos comprovam que o pedido de informações foi feito direto pela Polícia, sem aval do Judiciário.

"O inquérito foi instaurado em 25 de novembro de 2021, ao passo que o relatório de inteligência financeira foi solicitado em 21 de maio de 2021, seis meses antes de os pacientes serem formalmente identificados como investigados, o que evidencia violação às garantias constitucionais dos pacientes, que tiveram seus dados devassados sem que houvesse controle judicial ou prévio procedimento administrativo fiscal", disse.

Assim, diante da ilicitude do compartilhamento de informações sigilosas entre o COAF e a autoridade policial, sem a necessária autorização judicial, o desembargador considerou "inapto" o relatório de inteligência financeira em desfavor dos pacientes, "devendo ser desentranhado e inutilizado". Com isso, Lorenzi determinou o trancamento do inquérito, "uma vez que iniciado por prova ilícita".

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2092554-51.2022.8.26.0000