NA MIRA DE BOLSONARO, ALEXANDRE ASSUME UM TSE BLINDADO NESTA TERÇA-FEIRA
O ministro Alexandre de Moraes, a partir desta terça-feira (16/8), substituirá o ministro Luiz Edson Fachin na Presidência do Tribunal Superior Eleitoral. Ele estará à frente da corte durante pleito deste ano, que ocorre em outubro.
Ministro Alexandre de Moraes será o novo presidente do TSE a partir desta terçaTSE
Na mesma ocasião, o ministro Ricardo Lewandowski será empossado vice-presidente da Corte Eleitoral. A cerimônia será transmitida ao vivo pelo canal do TSE no YouTube e pela TV Justiça.
O magistrado assumirá um tribunal repleto de iniciativas para blindar as eleições contra ataques à sua lisura. No entanto, está na mira preferencial de ataques do presidente Jair Bolsonaro, que podem se intensificar até o fim do ano.
Acordos
Atualmente, as redes sociais são o principal meio de difusão de campanhas antidemocráticas e desinformação, que muitas vezes atingem as eleições. O TSE tem parceria com todas as grandes plataformas — apesar da brecha das redes sem sede no Brasil.
Existem acordos com WhatsApp, Facebook, Twitter, Spotify, Kwai e TikTok. O objetivo é denunciar, excluir ou reduzir o alcance de conteúdos que violem a legislação eleitoral ou ameacem o processo democrático. Outro grande parceiro da Justiça Eleitoral é o Google.
Em maio, também foi firmada uma parceria com o aplicativo de mensagens Telegram, muito usado para o repasse ilimitado de notícias fraudulentas.
O TSE possui um programa — criado em 2019 e tornado permanente em 2021 — de enfrentamento à desinformação. Durante sua gestão, iniciada em fevereiro, Fachin convidou instituições públicas e privadas para agir em defesa de democracia. Hoje, há uma Frente Nacional de Enfrentamento à Desinformação.
Dentre as instituições que se comprometeram em cooperar com o pleito e coibir a desinformação estão a OAB, a Câmara, o STF, os Tribunais de Justiça, a Procuradoria-Geral Eleitoral, a Associação Brasileira dos Advogados Criminalistas (Abracrim), associações da magistratura e do Ministério Público, entidades religiosas, os conselhos estaduais de Direitos Humanos (com o apoio do Conselho Nacional de Direitos Humanos) e agências de checagem.
Fachin também mobilizou organismos internacionais de observação eleitoral do mundo inteiro para acompanhar as eleições brasileiras deste ano e expor a confiabilidade do sistema.
O ministro que se despede da Presidência do TSE ainda se reuniu com diversos partidos para tratar de temas eleitorais e pensar acordos de colaborações. Os encontros foram feitos com PT, PL, MDB, União Brasil, Cidadania, PP, Podemos, Rede, Avante e PSC.
Proteção do pleito
O TSE, desde o último ano, aumentou os mecanismos de transparência e auditoria pública do sistema eleitoral, fez seu mais amplo teste de segurança do sistema de votação e decidiu que os partidos políticos poderão escolher quais equipamentos serão auditados.
O horário de votação foi alterado para evitar boatos sobre fraudes na apuração e no resultado das urnas. Neste ano, todos os brasileiros votarão simultaneamente, independentemente do fuso horário em que se encontram. Com isso, a votação no Acre, por exemplo, será das 6h às 15h.
A corte vem ampliando sua jurisprudência contra novas formas de manipulação das eleições. Em dezembro, por exemplo, proibiu oficialmente disparos em massa por meio de aplicativos de mensagem instantânea, como o Telegram.
Há ainda um precedente sobre a possibilidade de cassar um candidato pelo abuso do poder político e uso indevido dos meios de comunicação social ao espalhar fake news nas redes sociais. Trata-se da condenação do ex-deputado federal Fernando Francischini, que chegou a ser suspensa pelo ministro Nunes Marques, do STF, mas acabou mantida por decisão da 2ª Turma.
Tramita atualmente no STF uma investigação sobre o vazamento de informações sigilosas do TSE por Bolsonaro em uma de suas lives. O ato forçou a corte a reforçar a própria cybersegurança. Por meio deste inquérito, a Corregedoria-Geral Eleitoral já suspendeu a monetização de perfis nas redes sociais que divulgam fake news eleitorais.
Ministro Edson Fachin estava à frente do TSE desde fevereiroNelson Jr./SCO/STF
Passagem de bastão
Nos seus seis meses de gestão, Fachin pregou paz e segurança nas eleições e o respeito às urnas. "O processo eleitoral é transparente e se mostra aberto à fiscalização, tanto na ótica do eleitorado quanto dos atores políticos, mediado por uma instituição confiável e dialógica. Este TSE tem disponibilizado informações, justificado decisões e estabelecido um fluxo comunicativo que se traduz em governança horizontal e democrática", disse ele na sua última sessão como presidente da corte, na última terça-feira (9/8).
Segundo o ministro, seus esforços para proteger o sistema eleitoral consolidaram uma "enorme coalização nas trincheiras dos defensores da democracia, da transmissão responsável de informação e do enfrentamento das notícias falsas".
Na última quinta-feira (11/8), Fachin divulgou uma mensagem de apoio à democracia e criticou as narrativas que buscam causar conflito na normalidade das eleições.
"A inexistência de fraudes é um dado observável, facilmente constatado a partir da aplicação de procedimentos de conferência previstos em lei. Há, para tanto, ferramentas tecnológicas e jurídicas aptas à solução de dúvidas, pelo que inexistem razões lógicas, éticas ou legais para que se defenda, com malabarismos argumentativos, a falência do Estado constitucional, com a destituição, pela força bruta, do controle eleitoral atribuído às maiorias", assinalou ele.
A manifestação ocorreu no dia da leitura da "Carta às Brasileiras e aos Brasileiros em defesa do Estado Democrático de Direito" no Largo São Francisco, em São Paulo. O manifesto defende o sistema eleitoral, as urnas eletrônicas e outros pilares da democracia brasileira.
Alexandre comemorou o ato em suas redes sociais. Na sessão de despedida de Fachin, ele também deixou claro que sua gestão seguirá os mesmos princípios que vêm sendo aplicados na corte. De acordo com ele, seu antecessor "em nenhum momento se calou, em nenhum momento transigiu nem deixou que ataques covardes, pessoais, familiares e institucionais interferissem no mais importante: a condução da Justiça Eleitoral a caminho das eleições de 2022".
O próximo presidente do TSE defende há tempos a cassação de registros e a prisão de pessoas que repetirem estratégias adotadas em 2018, como o disparo em massa de fake news.
Quando foi eleito para o cargo, Alexandre reforçou: "A Justiça Eleitoral não tolerará que milícias pessoais ou digitais desrespeitem a vontade soberana do povo e atentem contra a democracia no Brasil".
Bolsonaro e Alexandre estão em conflito nos últimos anosFabio Rodrigues Pozzebom/ Agência Brasil
Executivo x Judiciário
Ataques à urna eletrônica são rotineiros na gestão Bolsonaro. As alegações de supostas fraudes, invasão hacker e atentados contra a democracia foram até mesmo apresentadas durante reunião com embaixadores no último mês.
O presidente da República já sugeriu desrespeitar decisões judiciais, pediu ao Senado o impeachment de Alexandre, acusou o ministro de abuso de autoridade e livrou Daniel Silveira dos efeitos de sua condenação no STF.
Bolsonaro concorrerá à reeleição em outubro e promete não aceitar uma derrota nas urnas. Desde 2018, quando saiu vencedor, o político já alegava a irregularidade do pleito e a existência de dados do TSE que comprovariam a impossibilidade estatística. Mas, desde então, nunca apresentou provas e foi amplamente desmentido pela corte eleitoral.
Alexandre já era o alvo preferencial do presidente porque é relator de inquéritos nos quais muitos alvos são aliados de Bolsonaro — como o das milícias digitais (Inq. 4.874) e o das fake news (Inq. 4.781), no qual o próprio presidente é investigado.
Foi o ministro quem decretou, por exemplo, a prisão do deputado federal bolsonarista Daniel Silveira em fevereiro do último ano, após ele ter feito sucessivos e graves ataques às instituições democráticas.
O mesmo ocorreu com outros apoiadores do presidente que atacam as instituições de forma agressiva, como os ativistas Sara Winter e Zé Trovão, os blogueiros Oswaldo Eustáquio e Allan dos Santos (atualmente foragido), o ex-deputado Roberto Jefferson e o youtuber Ivan Rejane Fonte Boa Pinto. Em boa parte dos casos, foram bloqueadas as contas dos investigados nas redes sociais.