Ver mais notícias

RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA E PARTICIPAÇÃO DA FASE DE CONHECIMENTO DO PROCESSO

Quem nunca ouviu algum caso de uma empresa ser surpreendida com ordem de pagamento de execução referente a processo do qual não fez parte? Essa é ainda uma situação bastante corriqueira para aqueles que enfrentam a Justiça do Trabalho, mas pode estar com os dias contados.

A demora não incomum no julgamento definitivo dos processos leva muitas vezes os reclamantes com créditos trabalhistas a perderem o paradeiro do seu ex-empregador, real devedor. Para satisfação de seu crédito, esses reclamantes passam a buscar outras empresas com coincidência de sócios ou que tenham sido resultado de reorganização societária do ex-empregador. Tais empresas passam a ser responsáveis por processo em fase já avançada, possuindo evidentes restrições para discussão de sua responsabilidade.

Essa possibilidade passou a ser chancelada pelos tribunais trabalhistas, desde o cancelamento da Súmula 205, do Tribunal Superior do Trabalho, ocorrida em novembro de 2003. Referido enunciado previa a necessidade de o responsável solidário, integrante do grupo econômico, participar da relação processual na qualidade de réu, para ser sujeito passivo na execução [1].

De lá para cá, foi publicado o novo Código de Processo Civil, por meio da Lei 13.105/2015, no qual passou-se a exigir a participação do fiador, coobrigado ou corresponsável na fase de conhecimento, para que a execução possa ser direcionada em face de referidas pessoas (artigo 513, §5º).

Recentemente, nos autos do ARE 1.160.361/SP, o Supremo Tribunal Federal cassou decisão proferida nos autos da reclamação trabalhista nº 0068600-43.2008.5.02.0089, a qual havia reconhecido a legitimidade de empresa pertencente ao mesmo grupo econômico da devedora principal para responder a execução trabalhista, de que não tinha participado da fase de conhecimento [2].

Entendeu o ministro Gilmar Mendes que, com o advento do Código de Processo Civil de 2015, é necessária revisitação da orientação jurisprudencial quanto à "viabilidade de promover-se execução em face de executado que não integrou a relação processual na fase de conhecimento, apenas pelo fato de integrar o mesmo grupo econômico para fins laborais" [3].  Referida decisão transitou em julgado.

Em reanálise do caso, conforme determinação do STF, em 13/05/2022, a 4ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho conferiu provimento ao recurso de revista da empresa, para afastar sua responsabilidade solidária, com o fundamento de ela não ter participado do processo na fase de conhecimento, o que caracterizaria violação aos direitos do contraditório e ampla defesa (artigo 5º, LIV e LV, da Constituição da República). A decisão foi amparada no artigo 513, §5º, do CPC.

O tema também é objeto de discussão nas ADPFs (Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental) 488 e 951, ainda pendentes de julgamento pelo STF.

Em razão da controvérsia da questão, em 23/05/2022, a ministra Dora Maria da Costa, vice-presidente do Tribunal Superior do Trabalho, determinou a suspensão "dos recursos extraordinários interpostos em que se discuta a inclusão de empresas que não tenham participado das ações desde o início, com fundamento na existência de grupo econômico" [4].

Estamos, pois, diante de uma possível alteração de posicionamento dos tribunais a respeito de questão processual envolvendo responsabilidade solidária de empresas pertencentes ao mesmo grupo econômico, gerando novamente a necessidade de que estas sejam incluídas no polo passivo da demanda, desde a fase de conhecimento, para que possam responder por eventuais créditos reconhecidos no processo.

Tal movimento representa, a nosso ver, avanço da jurisprudência, haja vista ser inconcebível nos dias atuais que qualquer pessoa — física ou jurídica — venha a responder por dívidas alheias, sem que possa se defender de forma plena e ampla.


[1] "Súmula nº 205 do TST. GRUPO ECONÔMICO. EXECUÇÃO. SOLIDARIEDADE (cancelada) — Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003. O responsável solidário, integrante do grupo econômico, que não participou da relação processual como reclamado e que, portanto, não consta no título executivo judicial como devedor, não pode ser sujeito passivo na execução".

[2] Disponível em: <https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=5544613>. Acesso em 31.07.2022, às 12h16min.

[3] Disponível em: <https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=5544613>. Acesso em 31.07.2022, às 12h16min.