PARTIDO QUE APRESENTA CANDIDATURA ÚNICA FEMININA É DISPENSADO DE CUMPRIR COTA
Para proteger a boa-fé do partido que pretendeu privilegiar a participação politica feminina nas eleições, o Tribunal Superior Eleitoral decidiu relativizar a cota de gênero prevista na lei e permitir que o Unidade Popular (UP) registre apenas uma candidatura nas eleições para deputado estadual no Rio Grande do Norte.
Ministro Benedito evitou paradoxo: para cumprir lei que busca mulheres na política, TSE teria de barrar candidatura feminina
Antonio Augusto/Secom/TSE
Na noite de terça-feira (13/9), a corte deferiu o registro do Demonstrativo de Regularidade de Atos Partidários (Drap) da legenda com o nome apenas de Thalia Lima para a Assembleia Legislativa potiguar. A votação foi por maioria de votos, conforme proposta do ministro Benedito Gonçalves, relator do recurso julgado.
A candidatura única do UP descumpre a cota de mínimo de 30% e máximo de 70% das candidaturas em representantes de cada sexo para cargos proporcionais, prevista no artigo 10, parágrafo 3º da Lei das Eleições (Lei 9.504/1997).
Essa hipótese, inclusive, chegou a ser discutida pelo TSE há dois meses e meio, em sede de consulta. Na ocasião, a corte concluiu que o contexto normativo faz com que seja impossível ao partido que tiver candidatura única para cargos proporcionais, matematicamente, alcançar os percentuais mínimo e máximo previsto na legislação.
No caso do UP, o ministro Benedito Gonçalves propôs uma nova interpretação, considerando que aplicar a lei a ferro e fogo causaria um paradoxo: para cumprir a lei que foi criada com o objetivo de garantir a participação feminina na política, o TSE precisaria impedir uma mulher de concorrer.
"Na hipótese, não há dúvida de que a finalidade da norma é promover a inclusão da mulher no processo eleitoral brasileiro. É imprescindível proteger a boa-fé da agremiação que pretendeu, ao contrário do que ocorre na maioria dos casos, privilegiar a participação política feminina", disse o relator.
A interpretação foi justificada a partir do artigo 5º da Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro (Lindb). A norma diz que "na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum".
Para o ministro Lewandowski, candidatura única para cargos proporcionais não concretiza o ideal perseguido pela lei
Antonio Augusto/Secom/TSE
Melhor assim
"Se aplicássemos a lei de forma literal, perderíamos na questão do gênero e, ainda por cima, em outra situação: participação de candidaturas negras", afirmou o ministro Benedito, em relação à candidata Thalia Lima, que é negra.
A relativização feita pelo TSE no caso do UP levou em conta, também, o fato de tratar-se de uma legenda nanica, fundada em 2016 e registrada no TSE em 2019.
Para o ministro Sérgio Banhos, exigir que a agremiação lançasse mais candidatos, em detrimento dos parcos recursos e dos esforços em torno da única candidata, poderia levar ao cenário incomum de gerar candidatura fictícia masculina.
O ministro Ricardo Lewandowski acompanhou o relator, mas pontuou que o lançamento de candidatura única para cargos proporcionais não concretiza o ideal perseguido pela lei. "O espírito da lei é garantir que a diversidade de pessoas que se faz presente na sociedade se reflita no exercício de mandatos", refletiu.
Ficou vencida a ministra Cármen Lúcia. "Tenho acompanhado desde a década passada este tribunal lutar para dar eficácia plena e não permitir que partidos deixem de cumprir rigorosamente o que está posto na lei. O espírito da lei é no sentido contrário do que está sendo proposto. Entendo o esforço, mas não há motivos", disse.
REspe 0600354-43.2022.6.20.0000