NOVAS REGRAS DAS OFERTAS PÚBLICAS: O QUE ERA BOM VAI MELHORAR
Segundo dados publicados pela Anbima (Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais), as emissões no mês de julho registraram a marca de R$ 80,8 bilhões, um aumento de 49,5% em comparação ao mês de junho. Considerando o resultado anual, o mercado de capitais brasileiro já registra R$ 317,9 bilhões de janeiro a julho de 2022, contra os R$ 315,4 bilhões do mesmo período do ano anterior
O aumento no volume de emissões possui relação com o cenário econômico mundial, mas também está ancorado em um arcabouço regulatório bastante conhecido e testado pelos emissores e investidores, hoje regidos principalmente pelas instruções normativas 400 (ICVM 400), que trata das ofertas destinadas ao público em geral e dependem de uma concessão de registro prévia da CVM (Comissão de Valores Mobiliários), e a instrução normativa 476 (ICVM 476) que trata de ofertas destinadas a um número restrito de investidores conhecidos acostumados com o mercado de capitais, conhecidos como investidores profissionais.
Exemplificativamente, se considerarmos somente as emissões de debentures realizadas neste ano foram realizadas 63 ofertas públicas (ICVM 400) totalizando o valor de R$ 66 milhões e 2.854 Ofertas Públicas com Esforços Restritos (ICVM 476), totalizando o valor de pouco mais de R$ 1,36 bilhão.
Apesar do mercado de capitais no país estar aquecido, e as instruções normativas sobre o tema estarem bastante consolidadas, a CVM editou a Instrução Normativa 160 (ICVM 160), um novo marco regulatório para ofertas públicas em que todas as ofertas passem a ser obrigadas a ter registro perante a autarquia.
Um primeiro olhar para tal notícia pode causar espanto, principalmente para investidores e emissores acostumados com as Ofertas Públicas de Esforços Restritos (ICVM 476), até então dispensadas de registro prévio na CVM.
Calma, tudo que é bom pode melhorar! As novas regras trazidas pela resolução CVM 160 simplificaram e trouxeram mais agilidade para às operações no mercado de capitais, conforme explicado a seguir:
O que mudou para todo mundo?
Dentre as novidades trazidas merecem destaque a criação da obrigação de registro de todas as ofertas perante a CVM, a criação de uma nova categoria de emissor, a simplificação dos documentos da oferta e a consolidação de entendimentos da CVM em uma única norma. Os pontos destacados a seguir são resumo de algumas das principais mudanças que se aplicam para todas as ofertas em geral:
Registro das ofertas. Pela nova resolução todas as ofertas serão registradas na CVM, mas a depender das características da emissão e/ou dos investidores que se destinam as ofertas contarão com a possibilidade de um registro automático na autarquia.
Novas categoria de emissores: foi criada uma nova categoria de emissor denominada Emissor Frequente de Valores Mobiliários de Renda Fixa ("Emissor Frequente Renda Fixa") que é atribuída aos Emissores com Grande Exposição ao Mercado ("Emissor de Grande Exposição"), que estão previstos na Instrução CVM 481, ou para Emissores que cumulativamente: a) estejam registrado nas categorias A ou B há mais de 24 meses e estejam em fase operacional; b) tenham cumprido suas obrigações periódicas nos últimos doze meses; e c) nos últimos quatro exercícios sociais tenham realizado ofertas públicas submetidas ao rito ordinário em montante total igual ou superior a R$500.000.000,00 do valor mobiliário de renda fixa que pretenda ofertar ou tenha realizado ao menos duas ofertas públicas submetidas ao rito de registro ordinário do valor mobiliário de renda fixa que pretenda ofertar.
Rito de registro ordinário: o rito aplicável para todas as ofertas que não se enquadrem em uma hipótese de registro automático e possui poucas diferenças em relação ao rito atual previsto na ICVM 400, com destaque para alterações de prazos de análise e manifestações pela CVM e simplificação e modernização dos documentos que devem ser apresentados.
Rito de registro automático: no pedido automático o registro é concedido sem análise prévia da CVM mediante a apresentação dos seguintes documentos: a) comprovante do pagamento da taxa da emissão, b) formulário eletrônico de registro da oferta; e c) Declaração de que o registro de emissor se encontra atualizado, no caso de emissores registrados. Caso o público-alvo não seja composto apenas de Investidores Profissionais é obrigatório também a apresentação do Prospecto e da Lâmina.
O Registro Automático manteve as principais vantagens de uma Oferta Pública com Esforços Restritos e eliminou algumas de suas limitações como, por exemplo, o limites ao número de potenciais investidores que podem ser acessados, as restrições de negociação após a oferta e o limite de quatro meses para realização de nova oferta de mesmo valor mobiliário pelo mesmo emissor.
Poderão contar com o registro automático:
— Ofertas de títulos de dívida: contarão com registro automático sempre que: a) forem destinados exclusivamente a investidores profissionais; b) forem destinadas para investidores qualificados e o emissor seja uma companhia aberta de Categoria A ou B, um Emissor de Grande Exposição, um Emissor Frequente Renda Fixa, uma Securitizadora ou seja uma sociedade de propósito específico de capital fechado emitindo debentures incentivadas; e c) forem destinadas para o Público em Geral e os emissores sejam um Emissor de Grande Exposição ou um Emissor Frequente Renda Fixa.
— Ações e títulos híbridos: contarão com registro automático sempre que: a) forem destinados exclusivamente a investidores profissionais ou Qualificados e a emissora seja uma Companhia Aberta de Categoria A com ações listadas em bolsa ou um Emissor de Grande Exposição; e b) forem destinadas para o Público em Geral e os emissores sejam um Emissor de Grande Exposição;
Documentos da oferta: O prospecto, que é documento que contém todas as informações sobre as emissões deve ser utilizado em todas as ofertas que não sejam destinadas exclusivamente a investidores profissionais, passa a ter cinco modelos, uma para cada tipo de valor mobiliário a ser ofertado. Os novos prospectos terão limitação de páginas e deverão ser mais diretos sobre os fatores de risco, discriminando os riscos em uma escala de menor, médio ou maior relevância e prever de forma clara eventuais relacionamentos e conflitos de interesse.
Além do prospecto, foi criada a introdução da lâmina da oferta, que deverá resumir as informações essenciais da oferta e do emissor, e dos cinco principais fatores de risco da Emissora.
Os documentos que divulgam a evolução do oferta como o aviso ao mercado, o aviso de início de distribuição e o anúncio de encerramento também sofreram mudanças e visando sua simplificação e evitar a repetição de informações desnecessárias ao longo das divulgações realizadas nos diversos documentos da oferta.
Análise sigilosa: O novo arcabouço regulatório permite ao ofertante optar por a) pedir sigilo com relação à documentação da oferta, mas anunciar que submeteu pedido de registro de oferta; ou b) sigilo de todas as informações da oferta. Além disso, há a resolução expressa da possibilidade de consultas sigilosas a potenciais investidores profissionais, antes mesmo do protocolo do requerimento da oferta pública. Desta forma, é possível testar a viabilidade e o apetite desses investidores antes de se aventurar no lançamento de uma oferta. Vale ressaltar que uma das condições impostas pela CVM para a realização desta consulta é que ela não pode ser vinculante ou conter qualquer forma de benefícios ou pagamentos a qualquer um dos envolvidos em razão da consulta.
O Que Mudou para a Oferta de Ações?
Ofertas públicas de ações destinadas a um grupo menor de investidores devem enfrentar um tramite mais burocrático que o atual, uma vez que a análise prévia de uma entidade conveniada passará a ser obrigatória e as SPACs ganharam uma regulamentação mais detalhada para suas ofertas. Os pontos destacados a seguir são resumo das principais mudanças aqui mencionadas:
— Análise de ofertas públicas de ações: As Ofertas Públicas de Ações protocoladas pelo rito automático terão de ser previamente analisadas por entidades autorreguladoras, como a Anbima, um requisito que não existe para as Ofertas Públicas de Ações realizadas no regime de Esforços Restritos 9ICVM 476).
— Spacs: As ofertas realizadas por sociedades com propósito de aquisição de companhia, (Spac) não terão a obrigação de elaborar um estudo de viabilidade econômico-financeira e, até o término do prazo de seis meses contados da operação societária que resulte na combinação de negócios entre a Spac e sociedade operacional por ela adquirida, a negociação de seus valores mobiliários deverão ser realizadas somente entre investidores qualificados.
O que mudou para os fundos de investimento?
Foram criadas algumas hipóteses de ofertas automáticas para fundo de investimentos, principalmente em caso de ofertas de cotas subsequentes, o que deve agilizar a emissão de valores mobiliários. Ofertas de fundos exclusivos fechados não estão sujeitas ao regime das ofertas públicas, dado o perfil e os interesses dos investidores a que são destinados. A grande mudança fica a cargo do aumento das responsabilidades dos gestores nas ofertas públicas, que passam a figurar junto com os administradores como ofertantes. Os pontos destacados a seguir são resumo de algumas das principais mudanças que se aplicam para as ofertas de cotas de fundos de investimento:
— Rito automático: Como regra geral as ofertas de cotas de fundo de investimento deverão ser feitas pelo rito ordinário, mas há duas exceções a esta regra que possibilitam fundos fechados obter o registro automático, sendo elas: a) caso uma entidade autorreguladora conveniada faça a análise do requerimento de registro; e b) ofertas de cotas subsequentes sem mudanças na política de investimentos do fundo ou no seu público-alvo em relação a oferta anterior. Em ambos os casos, continua obrigatória a divulgação do prospecto e da lâmina.
— Dispensa de realização de ofertas públicas: Fundos de investimento fechados exclusivos ofertas de valores emitidos e admitidos à negociação em mercados organizados de valores mobiliários estrangeiros não estão sujeitos ao novo arcabouço regulatório e estão dispensados de realizar ofertas públicas.
— Responsabilidades dos gestores: O gestor passa a figurar, ao lado do administrador, como ofertante no caso de oferta pública inicial de cotas de fundos de investimento e, por consequência, estará sujeito às obrigações aplicáveis às ofertas no âmbito do no arcabouço regulatório devendo firmar a declaração de veracidade das informações divulgadas nos prospectos preliminar e definitivo.
O novo arcabouço regulatório das ofertas públicas conseguiu melhorar o que já era bom trazendo modernizações, simplificações e consolidações de entendimentos. As novas regras entram em vigor em 2 de janeiro de 2023. As ofertas que estiverem em curso na referida data serão regidas pelas normas vigentes na data do protocolo do requerimento de registro da oferta, para as ofertas realizadas nos termos da ICVM 400 ou na data em que houve o comunicado de início da oferta, para as ofertas realizadas nos termos da ICVM 476.