CONSIGNADO DO AUXÍLIO BRASIL: BENEFICIÁRIOS SÃO INFORMADOS QUE DINHEIRO PODE DEMORAR ATÉ 15
Com a justificativa de ‘excesso de solicitações’, Caixa frustra beneficiários que contrataram empréstimo vinculado a auxílio e esperavam valor na conta em 48 horas.
Foto: Marcos Santos/USP Imagens
Pessoas que contrataram o consignado do Auxílio Brasil foram avisadas pela Caixa que o dinheiro do empréstimo só será depositado após as eleições. A proposta do governo federal, ao criar a linha de crédito, era que o dinheiro caísse na conta em 48 horas e não em 15 dias.
Ao Estadão, a Caixa justifica que há um “excesso de solicitações” que ocasionou “lentidão nos processamentos”, mas afirma que a liberação do crédito se dá no máximo em cinco dias. A reportagem, contudo, teve acesso a mensagens enviadas pelos bancos aos clientes nas quais informa que o “crédito ocorre entre 2 e 15 dias”.
O Instituto de Defesa do Consumidor (Idec) recebeu relatos de beneficiários para quem o dinheiro do empréstimo foi prometido apenas para dezembro.
Jenifer Kauane Batista contratou o consignado do Auxílio Brasil pela Caixa na terça-feira, dia 11, logo no primeiro dia em que estava disponível nas lotéricas. Dois dias depois, o empréstimo foi aprovado e ela foi informada de que o dinheiro seria liberado em 48 horas. Como a transferência não foi feita, ela ligou para o SAC do banco e a atendente deu uma outra informação: de que o prazo, na verdade, era de cinco dias. Na quinta, porém, ao checar o aplicativo do banco, o pedido que antes constava como “aprovado” havia voltado para o status “em processamento “.
“Tentei ligar no SAC novamente, mas não atendem. Também estou tentando falar no WhatsApp da Caixa, mas só dá erro. Não sei mais o que eu faço”, conta ela, que mora em Paranaguá (PR) com o marido e o filho de dois anos. Jenifer contratou um empréstimo de R$ 2,3 mil reais. “Esse dinheiro iria me ajudar muito para pagar contas atrasadas e comprar coisas para a minha casa”, diz.
Além da queixa geral, há muita desinformação nas redes sociais em torno do Auxílio Brasil. O Estadão acompanhou a movimentação de sete grupos de beneficiários do programa no WhatsApp, Facebook e no Telegram.
O clima das mensagens é um misto de indignação e revolta de quem ainda não conseguiu receber o dinheiro mesmo depois da contratação da operação e de insegurança com uma enxurrada de fake news em torno do consignado.
O Idec vem monitorando reclamações nas redes sociais sobre o consignado do Auxílio Brasil. Nos últimos dias, a instituição notou um aumento expressivo no número de queixas sobre o atraso no pagamento.
“Nas redes sociais, encontramos divulgação de fake news informando que, caso a pessoa deixasse de receber o auxílio, o governo iria assumir essa dívida”, diz Ione Amorim, coordenadora do Programa de Serviços Financeiros do Idec.
O atraso na liberação do dinheiro no período eleitoral tem gerado dúvidas nos beneficiários do programa.
Beneficiários são surpreendidos com seguro e taxas de até R$ 200
Além de juros de 50% ao ano no consignado do Auxílio Brasil – acima da média das taxas cobradas para outros segmentos –, usuários que contrataram o crédito se depararam com outras cobranças sobre as quais não sabiam no extrato do empréstimo, como juros de acerto e seguro prestamista.
Midiã Jacinto Almeida, da cidade mineira de Campanha, teve o empréstimo aprovado na segunda-feira e, passadas mais de 48 horas, não havia recebido o dinheiro nem conseguia informações. Ela e o marido, Ezequiel Duarte, pediram o empréstimo numa casa lotérica e não foram informados de outros custos, como seguro prestamista e juro de acerto.
A família teve autorizado um empréstimo de R$ 2.582,88 e receberá R$ 2.379,87 líquidos, com custo efetivo total de 59,78% ao ano. Além do IOF de R$ 75,55 (2,925%), foram cobrados o valor do seguro de R$ 65,08 e o do juro de acerto, de R$ 62,38. “No momento em que eu fiz, ninguém falou sobre esse seguro”, disse.
Segundo ela, o atraso no pagamento é o caso dela e de muitos outros beneficiários do programa. “Eu tenho um grupo no WhatsApp e no Facebook, e lá são vários depoimentos de pessoas que não estão conseguindo (receber o dinheiro).”
Para o Idec, a cobrança dessas taxas é abusiva. “Os juros de acerto são uma prática frequente dos bancos, quando aumentam o prazo de início de pagamento em mais de 30 dias. Essa condição encarece o crédito, pois o banco corrige o valor pelo tempo adicional que foi proposto”, explica a, coordenadora do Programa de Serviços Financeiros do Idec, Ione Amorim.
“Mas a Portaria 816/22, do Ministério da Cidadania, veda a ampliação para início de pagamento. Como não pode ser repassado nas parcelas por conta do teto da margem de 40%, incide na redução do valor liberado ao beneficiário, mais um abuso”, avalia.
Já o seguro prestamista, informa o Idec, é uma garantia em caso de inadimplência, morte ou invalidez. No caso do crédito consignado, o desconto é direto no benefício; então, o risco de inadimplência só ocorre no caso de saída do programa.
“Essa é uma condição opcional que, nesse caso, nem deveria ser oferecida, pois encarece ainda mais o crédito, que já tem uma taxa de juros elevada”, diz Ione. “Ao impor a contratação do seguro sem consulta prévia ou impor a cobrança para liberar o crédito, o banco está descumprindo o Código de Defesa do Consumidor”, diz.
O Idec elaborou uma nota técnica em que endossa o pedido feito pelo Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União (TCU) para a suspensão da oferta do crédito consignado para beneficiários do Auxílio Brasil. A entidade aponta possíveis riscos para os beneficiários e uso do serviço para fins eleitorais.
Questionada sobre as taxas adicionais no empréstimo, a Caixa não se manifestou.
Com informações do Estadão