AUMENTA PRESSÃO NOS EUA PARA SUPREMA CORTE ADOTAR UM CÓDIGO DE ÉTICA
Senadores do Partido Democrata submeteram ao Congresso dos EUA dois projetos de lei que pretendem forçar a Suprema Corte a adotar um código de ética — ou código de conduta — para seus ministros, a exemplo do "Código de Conduta para Juízes dos Estados Unidos" (Code of Conduct for United States Judges), ao qual todos os juízes federais de primeiro e segundo grau estão sujeitos — e o ministros da Suprema Corte não.
A iniciativa dos parlamentares se seguiu à aprovação de uma resolução (Resolution 400), acompanhada de um relatório, da American Bar Association (ABA), aprovada no Encontro de Meio de Ano da instituição, do qual participam advogados e juízes, entre outros profissionais da área. A resolução recomenda a adoção de um "código de ética vinculante" para os ministros da Suprema Corte, também à semelhança do código de conduta para os demais juízes.
De acordo com a resolução da ABA, os ministros da Suprema Corte devem elaborar seu código de ética imediatamente. Duas propostas para dar um prazo indeterminado para os ministros foram rejeitadas. Afinal, os ministros da Suprema Corte vêm discutindo se devem ou não adotar um código de ética há mais de quatro anos, mas nunca chegam a um consenso, segundo fontes da corte consultadas pelo Washington Post e New York Times.
Um dos PLs dos senadores democratas, com o título de Supreme Court Ethics Act (Lei da Ética da Suprema Corte), propõe, entre outros dispositivos, o estabelecimento de uma autoridade em ética, conforme disposto em lei, e um processo para protocolar reclamações contra um ministro, por violar as regras da ética.
O outro PL, intitulado Supreme Court Ethics, Recusal and Transparency Act (Lei da Ética, Impedimento/Suspeição e Transparência da Suprema Corte), propõe, entre outras coisas, o estabelecimento de um processo de reclamação e a criação de um painel para rever problemas com critérios dos ministros.
O PL também requer que a corte adote um código de ética e o publique online, esclarecendo detalhadamente os padrões que indicam quando um juiz deve ser declarar impedido/suspeito (recuse himself ou herself).
Além dos parâmetros conhecidos para um juiz se declarar impedido ou suspeito, isso também deve acontecer quando uma ação envolve partes que se empenharam, de alguma maneira, para o sucesso da confirmação, pelo Senado, de um juiz indicado pelo presidente para a Suprema Corte.
São mais conhecidos os casos de ministros que fazem investimentos em empresas que, um dia, podem ser uma parte em uma ação na corte, que ganham passagens aéreas, hospedagens, presentes ou qualquer outro tipo de remuneração. Segundo o PL, essa análise se estende a cônjuges e filhos dos ministros.
E impõe um "dever claro de o juiz ou ministro saber" quando ele ou sua família pode ter algum ganho financeiro de alguma organização que é parte de um processo na corte.
Credibilidade e legitimidade da corte
A ABA, por sua vez, argumenta que o objetivo de sua resolução é o de proteger a Suprema Corte. "É preciso reforçar o conceito e a credibilidade da corte perante a população do país e dentro da profissão."
"A inexistência de um código de ética vinculante, claramente articulado, para os ministros da corte põe em perigo a legitimidade da corte", diz o relatório que acompanha a resolução.
"Um judiciário independente é a pedra fundamental do estado do direito e da república constitucional. Ele protege a liberdade das pessoas. No entanto, o apoio público a um judiciário independente só pode ser sustentado se houver confiança pública na legitimidade do judiciário. Confiança pública requer que o público acredite que os juízes agem eticamente, de acordo com padrões firmemente fundamentados na independência, integridade e imparcialidade judicial", declara a ABA em seu relatório.
A última pesquisa do Gallup (de setembro de 2022) indica que 40% da população aprova o trabalho da Suprema Corte, 58% desaprova e 3% não tem opinião. É o índice de aprovação mais baixa nas últimas décadas. Em 2000, por exemplo, 62% da população aprovava o trabalho da Suprema Corte e apenas 29% desaprovava. De lá para cá, o índice de aprovação vem caindo progressivamente.
O delegado do estado de Washington, James Williams, declarou, ao apresentar a resolução: "O povo precisa saber que o sistema jurídico, em seu nível mais alto, tem algum código que governa sua conduta. Como podemos explicar a ele que todos os advogados e juízes do país tem um código de conduta, mas a Suprema Corte não tem."
Casos mais falados
Em março de 2022, especialistas em ética conclamaram o ministro Clarence Thomas a se declarar impedido (ou suspeito) para julgar alguns casos que envolviam o ex-presidente Donald Trump, por causa da participação ativa de sua mulher, Virginia "Ginni" Thomas, nos esforços para reverter o resultado da eleição presidencial de 2020. Thomas não deu ouvidos aos clamores.
Há poucas semanas, Kendal Price, ex-recrutador da banca Major, Lindsey & Africa, pediu ao Departamento de Justiça para examinar os cheques de pagamento de sua ex-colega Jane Sullivan Roberts, mulher do presidente da Suprema Corte, John Roberts. Ele alega que Jane Roberts recebeu milhões de dólares colocando advogados em algumas bancas, algumas das quais com casos perante a corte. Roberts declarou que o código de conduta dos juízes não requer que ele se declare suspeito nesse caso.
Em novembro de 2022, o reverendo Rob Schenck disse ao New York Times que tomou conhecimento, de antemão, que o ministro Samuel Alito iria escrever o voto a maioria em um caso (Burwell v. Hobby Lobby Stores) de 2014, que iria favorecer as organizações com objeções religiosas contra a cobertura de seguro obrigatória de contraceptivos para seus empregados. Quem lhe disse foi Gayle Wright, doadora de sua organização evangélica, depois que ela e o marido jantaram com Alito e sua mulher. Com informações do Jornal da ABA, Washington Post, New York Times, The Hill, CNN, Yahoo! News, Forbes e outras publicações.