TSE ANALISA SE TAMBÉM PUNE DIRIGENTE PARTIDÁRIO POR FRAUDE À COTA DE GÊNERO
O Tribunal Superior Eleitoral vai analisar de que forma seria possível estender ao dirigente partidário a inelegibilidade causada pela prática da fraude à cota de gênero nas eleições proporcionais.
Ministra Maria Cláudia chamou atenção contra banalização da inelegibilidade de mulheres envolvidas na fraude eleitoral
LR Moreira /Secom/TSE
O tema foi levantado pela ministra Maria Cláudia Bucchianeri, no julgamento que trata de fraude praticada por candidatos do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) e do Avante nas eleições para a Câmara dos Vereadores de Andradina (SP), em 2020.
As ações de investigação judicial eleitoral (Aijes) ajuizadas contas as legendas foram julgadas improcedentes pelo Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo. Relator no TSE, o ministro Carlos Horbach propôs revisar a decisão para condenar as legendas pelo ilícito.
A posição é de que os partidos usaram duas candidaturas fictícias para cumprir a cota mínima de 30% de mulheres no pleito. Ambas tiveram votação zerada, gastos de campanha ínfimos e pouco ou nenhum ato de divulgação para o eleitorado, indícios suficientes de que houve fraude.
A jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral é pacífica ao definir que, nesses casos, a inelegibilidade do artigo 1º, inciso I, alínea "d" da Lei Complementar 64/1990 recai sobre quem praticou ou, no mínimo, anuiu à fraude à cota de gênero.
Relator do recurso no TSE, o ministro Carlos Horbach propôs dar provimento aos recurso especiais eleitorais contra PTB e Avante para cassar todas as candidaturas à Câmara Municipal de Andradina. Mas só impôs a inelegibilidade às duas mulheres que protagonizaram a fraude.
O risco, segundo a ministra Maria Cláudia Bucchianeri, é de que a Justiça Eleitoral esteja impondo essa punição exclusivamente às mulheres de maneira automática. Nesta quinta-feira, ela pediu vista para analisar o tópico.
"O que temos percebido nos grupos focais que estudam a questão da presença feminina na política é um certo automatismo na imposição irrestrita de inelegibilidade às mulheres, sem a inclusão dos dirigentes partidários", disse. "Fica difícil imaginar fraude à cota de gênero sem a participação dos dirigentes dos partidos", acrescentou.
Banalização
Essa preocupação já foi levantada pela ministra Maria Cláudia no TSE, em julgamento de outro caso sobre fraude à cota de gênero, em agosto de 2022. Na ocasião, ela chamou a atenção para a banalização da imposição de inelegibilidade feminina, mas não teve a oportunidade de enfrentar o tema no recurso.
Essa banalização é uma possibilidade porque, nem sempre, a mulher será culpada pela candidatura fictícia. A ministra costuma citar o livro da pesquisadora Roberta Laena, Fictícias: candidaturas de mulheres e violência política de gênero (2020), para exemplificar.
A pesquisa de Laena identifica diversas maneiras de estabelecer uma candidatura fictícia para fins de cumprimento da cota de 30% de mulheres nas eleições proporcionais. Dentre elas está a candidatura involuntária: quando a mulher nem sabe que está concorrendo.
A pesquisadora falou sobre o tema em entrevista à revista eletrônica Consultor Jurídico. "Existem muitos casos de mulheres que sequer sabem que são candidatas. Só o caso concreto vai poder dizer se é para ser declarada a inelegibilidade. É o que vem acontecendo nos tribunais", apontou, em setembro de 2022.
Anuiu com a fraude
O Tribunal Superior Eleitoral, aliás, já puniu dirigente partidário pela fraude à cota de gênero. Aconteceu na disputa para vagas na Câmara Municipal de Pimenteiras (PI) em 2016, quando o Tribunal Regional Eleitoral do Piauí identificou candidaturas fictícias na coligação integrada pelo Partido Social Brasileiro (PSB).
O ilícito foi organizado em reunião partidária em que foram indicadas, à parte, sem a presença das mulheres, para supostas vagas remanescentes, candidaturas femininas somente para, de forma ilícita, viabilizar as candidaturas masculinas previamente escolhidas.
Presidente do PSB local à época, Amysthanio Rodrigues Alves foi um dos três representantes que organizaram a prática da fraude. Em 2021, o TSE confirmou que o dirigente praticou ou, no mínimo, anuiu com o ilícito eleitoral, o que é suficiente para decretação da inelegibilidade prevista no artigo 1º, inciso I, alínea "d" da LC 64/1990 (clique aqui para ler o acórdão).
AREspe 0601556-31.2020.6.26.0009 (Andradina-SP)
AREspe 0601558-98.2020.6.26.0009 (Andradina-SP)
AREspe 0600103-74.2020.6.18.0089 (Pimenteiras-PI)