NOVA LIA PODE AFETAR CASO DE IMPROBIDADE NA CONSTRUÇÃO DA ARENA CORINTHIANS
As alterações promovidas pela nova Lei de Improbidade Administrativa (Lei 14.230/2021) podem derrubar a ação em que o Ministério Público de São Paulo tenta responsabilizar os envolvidos na construção da Arena Corinthians pela concessão ilegal de benefícios fiscais.
Arena Corinthians foi viabilizada para receber jogos da Copa do Mundo de 2014
cdc arquitetos
A discussão foi admitida para julgamento no Superior Tribunal de Justiça em maio de 2021 e envolve a sanção da Lei municipal 15.413/2011, que buscou viabilizar a construção de um estádio na zona leste de São Paulo para a abertura da Copa do Mundo de 2014.
A tese do órgão acusador é de que o então prefeito Gilberto Kassab propôs e sancionou a lei para dar ares de legalidade a uma renúncia fiscal direcionada a beneficiar empresas pré-determinadas. A medida teria violado os princípios da moralidade, legalidade e impessoalidade.
A norma permitiu que empresas interessadas recebessem até 60% do valor investido na obra do estádio, na forma de Certificados de Incentivo ao Desenvolvimento (CIDs), que poderiam ser usados para abater o pagamento de ISS e IPTU próprios ou mesmo de terceiros. Houve, ainda, a suspensão da cobrança de ISS.
A ação também teve como alvo duas empresas de investimento criadas especialmente para investir na arena, além do Sport Club Corinthians (dono do estádio) e da Odebrecht (executora da obra). O prejuízo aos cofres públicos, segundo o MP-SP, é da ordem de R$ 420 milhões.
Nas instâncias ordinárias, a ação foi julgada improcedente. O Tribunal de Justiça de São Paulo concluiu que o benefício fiscal estava condicionado à finalização da obra, de maneira a proteger o erário, e que não houve ofensa ao Código Tributário Nacional ou à Lei de Responsabilidade Fiscal.
Caberia ao STJ avaliar se as condutas apontadas pelo MP-SP podem ser enquadradas como improbidade administrativa. O problema é que, desde então, a lei de regência foi profundamente alterada.
Obras foram viabilizadas com incentivo fiscal criado por meio de lei municipal
Reprodução
Cadê o dolo?
Segundo o MP-SP, as condutas imputadas se enquadram no artigo 10, incisos VII e X da Lei de Improbidade Administrativa, que tratam da dispensa de licitação e de negligência na arrecadação de tributo.
Na redação atualizada dessas normas, agora há a exigência do dolo do agente: a vontade deliberada de cometer especificamente o ato ímprobo. A principal alteração da nova LIA foi extinguir os tipos culposos de improbidade administrativa. O inciso VII ainda passou a exigir que a dispensa da licitação tenha acarretado perda patrimonial efetiva.
Para a defesa de Gilberto Kassab, feita pelos advogados Igor Sant’Anna Tamasauskas e Otávio Ribeiro Lima Mazieiro, as alterações são aplicáveis ao caso concreto de forma retroativa, na forma como definiu o Supremo Tribunal Federal no julgamento do Tema 1.199 da repercussão geral.
A ação do MP-SP também apontou a ocorrência da improbidade como definida até então no artigo 11: qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente.
Esse artigo, atualizado, além de exigir dolo na conduta, traz em seus incisos um rol taxativo de condutas. Ou seja, a configuração da improbidade depende de o ato estar ali listado. Para a defesa, houve uma revogação de tipificação: o que o MP-SP apontou como ilícito já não tem mais esse caráter.
A manifestação da defesa ganhou eco na petição do Ministério Público Federal, que se posicionou na condição de fiscal da lei. Para o órgão, caiu a acusação pelo artigo 11 da LIA, enquanto que a presença de dolo necessária para incidir artigo 10 dependeria da análise de fatos e provas pelo STJ, medida vedada pela Súmula 7.
O MP-SP, por sua vez, diz que, pelos fatos já apontados nos autos, as condutas de Kassab e demais acusados trazem comportamento doloso, o que afasta a retroatividade da nova LIA. Basta que seja feita uma revaloração pelos ministros. As petições serão analisadas pelo ministro Herman Benjamin, relator do recurso especial.
REsp 1.938.562