CLT PRECISA DE AJUSTES PONTUAIS PARA EVOLUIR, DIZ MARIA CRISTINA PEDUZZI
Ao longo de seus recém-completados 80 anos, a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) cumpriu importante papel como instrumento disciplinador das relações profissionais no Brasil. Porém, mesmo com as atualizações feitas em 2017 pela reforma trabalhista, a lei carece de mais ajustes, a fim de flexibilizá-la quanto à dinâmica estabelecida pelas plataformas digitais.
Para a ministra, lei precisa ser flexível para contemplar novas relações de trabalho
A avaliação é da ministra Maria Cristina Peduzzi, do Tribunal Superior do Trabalho. Com a vivência de quem presidiu a corte no biênio 2020-2022 — isto é, em pleno período da crise da Covid-19 e em meio às profundas mudanças promovidas pela epidemia no mundo do trabalho —, a magistrada opinou sobre a CLT e os novos tempos em sua participação na série "Grandes Temas, Grandes Nomes do Direito", na qual a revista eletrônica Consultor Jurídico conversa com algumas das mais influentes personalidades do Direito brasileiro sobre os assuntos de maior relevância da atualidade.
"Hoje aos 80 anos, com uma série de modificações, a CLT foi ajustada a seu tempo. Tivemos inclusive a reforma trabalhista, que foi produzida em 2017 e que objetivou justamente fazer ajustes, e ela vem se mantendo jovem. Penso que teremos vida longa na CLT com os ajustes pontuais produzidos e que são necessários para que se evolua", disse a ministra.
Na entrevista, ela observou que o mundo do trabalho vive uma quadra histórica incomum justamente no momento em que o papel da CLT volta a ser celebrado.
"O momento em que ela completa 80 anos é muito significativo e relevante para as relações de trabalho, porque estamos inseridos em contexto de reformas globais e tecnológicas importantes. Vivemos na época em que a inteligência artificial substitui parte das atividades realizadas pelos humanos."
Tais inovações têm levado a Justiça do Trabalho a se adaptar, segundo a ministra. Um exemplo desse movimento foi a digitalização dos processos e da atividade jurisdicional como um todo.
"Sem dúvida o Poder Judiciário revelou a sua aptidão e sua inserção neste mundo tecnológico quando veio a pandemia. Eu tinha acabado de assumir a presidência do TST quando foi decretado o estado de emergência, e nós vivemos um período sem interrupção da atividade jurisdicional. Porque já tínhamos o processo judicial eletrônico praticamente implementado."
Iniciativas como essa, porém, não podem ficar limitadas à Justiça. Nesse sentido, também cabe ao trabalhador, de acordo com a ministra, refletir sobre as transformações e sobre o impacto delas em sua vida profissional.
"As pessoas que trabalham, dependendo de sua atividade, precisam se sintonizar com este novo tempo. Por isso que o teletrabalho, que foi disciplinado na época da reforma, foi tão importante."
Ainda sobre os abalos causados pela nova dinâmica do mercado de trabalho, Peduzzi acredita que marcos civilizatórios como o reconhecimento do vínculo de emprego e os direitos trabalhistas não vão acabar. Porém, a legislação deve abrir espaço para as novas formas de contrato.
"Nas contratações que se operam por meio das plataformas digitais, nós temos relações autônomas de trabalho que têm outro tipo de garantia. Garantias, direitos mínimos civilizatórios sempre existirão. O ser humano não vive num mundo selvagem, ele vive no mundo em que a dignidade da pessoa humana é um imperativo constitucional. Apenas temos de ter flexibilidade para contemplar outras formas que também asseguram direitos e disciplinam deveres e obrigações."