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CARF: CONTRIBUINTE QUE PERDER PROCESSO POR DESEMPATE NÃO PAGARÁ MULTA E RELATOR NEGA “NOVO REFIS” NO PROJETO

Confira como deve funcionar a dispensa da garantia nos julgamentos do Carf.

 
Carf: contribuinte que perder processo por desempate não pagará multa e relator nega “novo Refis” no projetoPxhere
 

Nesta segunda-feira (3), o relator do projeto de lei do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), Beto Pereira (PSDB-MS), manteve em seu parecer a retomada do chamado “voto de qualidade”, que prevê que os desempates serão favoráveis à Receita Federal nos julgamentos do órgão. 

O deputado, no entanto, excluiu as multas cobradas aos contribuintes em caso de derrota, como estabelecido pelo acordo firmado entre o governo e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).

Pereira manteve no relatório a regra atual sobre o chamado “limite mínimo de alçada” para acesso ao Carf. Hoje, podem recorrer ao tribunal contribuintes cujo valor da ação em disputa seja a partir de 60 salários mínimos. O governo tentou alterar esse piso para mil salários mínimos na Medida Provisória (MP), com objetivo de reduzir o número de casos julgados pelo tribunal, mas o relator manteve a norma vigente.

 

No seu voto, o deputado diz reconhecer que a elevação do limite de alçada reduziria o tempo de tramitação dos processos administrativos, mas reforça que é necessário garantir o princípio do contraditório e da ampla defesa previsto na Constituição. Como compensação, o deputado incluiu no relatório uma instância inferior de julgamento na Receita Federal nas Delegacias de Julgamento (DRJs), com a possibilidade de sustentação oral do contribuinte.

O PL do Carf tramita com urgência constitucional e, por isso, passou a trancar a pauta da Câmara. Ou seja, antes de analisar qualquer outra proposta, os deputados precisam votar o projeto do Carf, caso a urgência não seja retirada pelo governo.

Dispensa de garantia

O Carf é o tribunal que julga conflitos tributários, como a aplicação de multas pela Receita Federal. Atualmente, ao terminar o processo administrativo no órgão com decisão favorável à União, a empresa pode recorrer da decisão no Judiciário, mas deve apresentar garantia de execução fiscal, com valor não apenas da dívida principal, mas também de multas, juros sobre multas e dívida e encargos legais. O valor da obrigação tributária, de acordo com especialistas, praticamente triplica ao chegar no Judiciário.

 

Por isso, o relator determinou no parecer que contribuintes com capacidade de pagamento estão dispensados de apresentar valores como garantia ao ingressarem com processos judiciais. Segundo o texto, a capacidade de pagamento será medida considerando-se o patrimônio líquido realizável da empresa, desde que o contribuinte apresente relatório de auditoria independente sobre as demonstrações financeiras e relação de bens livres e desimpedidos para futura garantia do crédito tributário, em caso de decisão desfavorável em primeira instância.

Além disso, segundo o texto, o contribuinte deverá comunicar à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) a relação de tais “bens livres e desimpedidos”, apresentando inclusive outros para fins de substituição, sob pena de medida cautelar fiscal. A empresa também não poderá ter outros créditos com a Fazenda Pública, “presentes e futuros, em situação de exigibilidade”, diz o texto.

Nos casos em que seja obrigatório apresentar garantia para levar à Justiça o caso com decisão favorável pelo voto de qualidade à Fazenda, o relatório diz que não será admitida a execução da garantia até o trânsito em julgado da medida judicial, “ressalvados os casos de alienação antecipada previstos na legislação”. Isso porque, atualmente, de acordo com tributaristas, em muitos casos em que há sentença de primeira instância desfavorável à empresa, a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN) já tenta executar a garantia antes do trânsito em julgado.

Acordo antes da inscrição da dívida

Pereira também determinou em seu parecer que a Receita Federal poderá firmar transações com os contribuintes na cobrança de créditos tributários não inscritos em dívida ativa da União. O relator também ampliou o prazo para inscrição do crédito em dívida ativa de 30 para 90 dias.

“Hoje, a inscrição da dívida ativa pode ser a partir dos 30 dias, nós trouxemos isso para 90 dias. Aumentou o prazo para o contribuinte ser inscrito em dívida ativa e, nesse prazo, a gente possibilita a Receita Federal a patrocinar essa transação, algo que era exclusividade da PGFN”, disse.

O dispositivo incluído pelo relator altera um artigo da lei de 2020, que determina que a Receita Federal poderá propor transação na cobrança de créditos tributários em contencioso administrativo fiscal, sem mencionar débitos não inscritos na dívida ativa. A medida gerou um impasse com a PGFN. Procuradores queixam que poderiam ser excluídos do processo, além de avaliarem não ser adequado que auditores fiscais negociem autuações que foram lavradas por eles próprios.

Por trás dessa medida, também há uma disputa interna entre servidores da Receita e PGFN por honorários, segundo tributaristas. De acordo com especialistas ouvidos pela reportagem, se a Receita negocia a dívida e consegue receber o valor, o dinheiro pago pelo contribuinte vai impactar na arrecadação do órgão, o que afeta diretamente o cálculo dos bônus dos auditores. Se a Receita não puder transacionar e a transação só for possível no Judiciário, o valor pago vai para conta de arrecadação da PGFN.

O relator evitou, no entanto, comentar sobre eventuais divergências entre os órgãos ao ser questionado por jornalistas. “Eu não vou aqui arbitrar se existe um questionamento da PGFN com os auditores e não estou aqui para arbitrar essas particularidades de cada uma das corporações. O que estamos aqui abrindo a possibilidade para contribuinte de poder ter uma outra instância de negociação com as mesmas condições antevendo a inscrição na dívida ativa”, disse.

Autorregularização tributária

O relatório também estabelece que contribuintes que confessarem de forma espontânea que têm débitos tributários terão condições de parcelamento da dívida. É uma espécie de “autorregularização tributária”, medida proposta em emenda apresentada pelo deputado Baleia Rossi (MDB-SP).

Sobre a proposta, Beto Pereira negou que a emenda seja uma espécie de “Refis”. Ele afirmou ainda que a Fazenda se pronunciou de forma favorável à medida. “Não incluímos Refis algum dentro do projeto. Nós acatamos uma emenda do Baleia que possibilita a denúncia espontânea. O contribuinte leva à Receita o débito que ainda não foi autuado e ganha com isso a possibilidade de ter um parcelamento daquilo que ainda não havia sido lançado à Receita, portanto, vai haver com isso a possibilidade de trazer à luz do direito débitos que não foram lançados pela Receita Federal”, disse.

“Não é um Refis, porque o débito não está lançado. Não existe autuação deste débito”, continuou o relator. Ele garantiu que a Fazenda apoiou a proposta, mas ressaltou que pode haver algum detalhe que a pasta possa contestar.

Pelo texto, o programa de autorregularização tributária será aplicado aos créditos tributários que ainda não tenham sido constituídos até a data da publicação da lei, inclusive aqueles objeto de procedimento fiscal já iniciado. Os débitos devidos pelas empresas do Simples Nacional não poderão ser objeto do programa.

Segundo o relatório, o pagamento dos contribuintes que aderirem ao programa poderá ser realizado à vista ou em até 60 parcelas, mensais e sucessivas. Os juros incidentes serão reduzidos em 100% no caso de pagamento à vista; em 75% no caso de pagamento em até 12 parcelas; em 50% no caso de pagamento em até 30 parcelas; em 25% no caso de pagamento em até 48 parcelas; e não serão reduzidos caso o sujeito passivo opte pelo pagamento em 49 ou mais parcelas.

Fonte: Estadão