JUIZ PROÍBE VIAGENS INTERMEDIADAS PELA BUSER EM TRAJETOS NO ESTADO DE SP
A concorrência desleal entre empresas de transporte ocorre quando há meios fraudulentos e desonestos para influenciar os passageiros do concorrente e desviá-los do uso de outras linhas. O uso da autorização de fretamento para prestação do mesmo serviço de transporte rodoviário de passageiros a partir da cobrança individual de passagem e aberto ao público, com possibilidade de valores muito inferiores, se enquadra nessa hipótese.
Viagens foram questionadas pela Andorinha, empresa tradicional de transporteAnna Grigorjeva
Assim, a 1ª Vara Cível de Presidente Prudente (SP) proibiu a oferta e venda de passagens para viagens feitas por nove empresas fretadoras de ônibus e intermediadas pela plataforma Buser em diversos trajetos entre a capital paulista e as principais cidades do interior do estado.
Na mesma decisão, as fretadoras e a Buser foram condenadas a pagar indenização por danos materiais à viação tradicional Andorinha, devido à captação irregular de clientela. O valor será apurado na fase de liquidação.
Contexto
A startup Buser é responsável por uma plataforma digital que conecta pessoas interessadas em uma mesma viagem na mesma data com empresas fretadoras de ônibus.
Na ação, a Andorinha, que tem permissão para o transporte nas linhas regulares intermunicipais, alegou que as fretadoras parceiras da Buser estavam explorando a mesma atividade, embora tenham apenas autorização para fretamento.
O Decreto Estadual 29.912/1989 prevê que o transporte sob fretamento não pode ter cobrança individual de passagem, assumir caráter de serviço aberto ao público ou operar no regime de linha regular.
Fundamentação
O juiz Luiz Augusto Esteves de Mello considerou que o uso da plataforma para contratação prévia "permite ao público adquirir serviço aberto por meio de passagem individual", o que contraria o decreto paulista.
Para o magistrado, a aquisição da passagem por meio da Buser, além de equivaler à compra individual de passagem, representa serviço aberto ao público, "na medida em que assegura acesso a qualquer pessoa, até alcançar o limite mínimo de passageiros para a realização da viagem".
Mello ressaltou que a execução do serviço de transporte coletivo "deve se dar diretamente pelo poder público ou por meio de regulamentação própria".
A Buser argumentou que os próprios usuários cadastrados sugerem viagens e criam grupos, e que elas não ocorrem caso não se atinja um número suficiente para viabilizar o rateio. Mas o juiz entendeu que tais alegações "não foram sequer minimamente comprovadas".
De acordo com o magistrado, os danos materiais são presumidos, devido à "relevância da conduta ilícita praticada no âmbito empresarial, notadamente o desvio de clientela de forma indevida".
Guerra jurídica
O fretamento colaborativo no transporte rodoviário de passageiros vem sendo objeto de disputas judiciais em todo o Brasil nos últimos anos. A maioria dos casos dessa "guerra jurídica" é protagonizada pela Buser.
Estados como Ceará e Paraná, além do Distrito Federal, possuem decisões contrárias à atividade da startup. Por outro lado, a empresa concentra um volume maior de decisões favoráveis em alguns dos estados mais populosos do país, como São Paulo e Rio de Janeiro.
No último mês de fevereiro, o Tribunal Regional Federal da 3ª Região autorizou, em todo o país, as viagens de ônibus fretadas em circuito aberto — ou seja, com um grupo diferente de pessoas nos trajetos de ida e volta — e proibiu a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) de autuar e apreender ônibus de viagens interestaduais intermediadas por plataformas como a Buser.
Especialistas ouvidos pela revista eletrônica Consultor Jurídico já apontaram alternativas para encerrar a polêmica envolvendo a Buser: a revisão da regulação (pela via administrativa ou legislativa) ou a fixação de um entendimento vinculante por parte do Supremo Tribunal Federal.
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Processo 1004664-03.2022.8.26.0482