ROSA WEBER PAUTA JULGAMENTO DO MARCO TEMPORAL PARA O PRÓXIMO DIA 30
A presidente do Supremo Tribunal Federal, ministra Rosa Weber, marcou para o próximo dia 30 a retomada do julgamento, com repercussão geral, que discute se a data da promulgação da Constituição Federal deve ser adotada como marco temporal para a definição da ocupação tradicional da terra por indígenas.
Expectativa é que, em caso de novo pedido de vista, Rosa Weber adiante seu voto
Carlos Moura/SCO/STF
O julgamento está paralisado desde junho por pedido de vista do ministro André Mendonça. Na ocasião, o magistrado se comprometeu a devolver o processo para julgamento antes da aposentadoria de Rosa Weber. Com a devolução, o STF deve voltar a julgar o caso, cujo primeiro pedido de vista foi do ministro Alexandre de Moraes, em setembro de 2021.
Os ministros Edson Fachin, relator do caso, e Alexandre votaram contra o marco temporal, em respeito à tradição das terras indígenas. O ministro Kassio Nunes Marques divergiu por considerar que a definição aumenta a segurança jurídica.
O processo que motivou a discussão no STF trata da disputa pela posse da Terra Indígena Ibirama-Laklãnõ, em Santa Catarina. No local vivem indígenas Xokleng, Guarani e Kaingang, e o governo catarinense entrou com pedido de reintegração de posse. Hoje existem mais de 300 processos de demarcação de terras indígenas abertos em todo o território nacional.
Votos dos ministros
Relator do recurso extraordinário com repercussão geral, Fachin votou em 2019 contra o marco temporal. De acordo com o ministro, os direitos originários dos indígenas sobre as terras que tradicionalmente ocupam não dependem da existência de uma delimitação.
Nunes Marques abriu a divergência na ocasião argumentando que a proteção constitucional das terras indígenas depende do marco temporal. Conforma o magistrado, os povos originários devem comprovar que ocupavam a área em 5 de outubro de 1988 ou que tenham sido expulsos dela. Sem essa limitação, há insegurança jurídica, disse o ministro.
Em voto-vista, Alexandre opinou que a fixação de um marco temporal viola direitos fundamentais dos indígenas.
O ministro ressaltou que o Estado deve indenizar quem, de boa-fé, comprou terra indígena. Afinal, nessa situação a culpa é do poder público, que não arcou com o dever de proteger as áreas pertencentes aos povos originários.
Alexandre propôs a seguinte tese de repercussão geral:
Os direitos territoriais indígenas consistem em direito fundamental dos povos indígenas e se concretizam no direito originário sobre as terras que tradicionalmente ocupam, sob os seguintes pressupostos:
I — a demarcação consiste em procedimento declaratório do direito originário territorial à posse das terras ocupadas tradicionalmente por comunidade indígena;
II — a posse tradicional indígena é distinta da posse civil, consistindo na ocupação das terras habitadas em caráter permanente pelos índios, das utilizadas para suas atividades produtivas, das imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar e das necessárias a sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições, nos termos do §1º do artigo 231 do texto constitucional;
III — a proteção constitucional aos direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam independe da existência de um marco temporal em 05 de outubro de 1988, ou da configuração do remitente esbulho como conflito físico ou controvérsia judicial persistente a data da promulgação da Constituição.
IV — Inexistindo a presença do marco temporal (CF/88) ou de remitente esbulho, como conflito físico ou controvérsia judicial persistente a data da promulgação da Constituição, são válidos e eficazes, produzindo todos os seus efeitos os atos e negócios jurídicos perfeitos e a coisa julgada, que tem a ver por objeto a posse, o domínio ou a ocupação de boa-fé das terras de ocupação tradicional indígena, ou exploração das riquezas, dos solos, rios e lagos nela existentes. Assistindo ao particular direito a indenização prévia em face da União, em dinheiro ou em títulos da dívida agrária, tanto em relação a terra nua quanto as benfeitorias necessárias e úteis realizadas.
V — Na hipótese prevista no item anterior, sendo contrário ao interesse público, a desconstituição da situação consolidada e buscando a paz social, a União poderá realizar a compensação as comunidades indígenas, concedendo-lhes terras equivalentes as tradicionalmente ocupadas, desde que haja expressa concordância.
VI — o laudo antropológico realizado nos termos do Decreto 1.776/1996 é elemento fundamental para a demonstração da tradicionalidade da ocupação de comunidade indígena determinada, de acordo com seus usos, costumes e tradições;
VII — o redimensionamento de terra indígena não é vedado em caso de descumprimento dos elementos contidos no artigo 231 da Constituição da República, por meio de procedimento demarcatório nos termos nas normas de regência;
VIII — as terras de ocupação tradicional indígena são de posse permanente da comunidade, cabendo aos índios o usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios e lagos nelas existentes;
IX — as terras de ocupação tradicional indígena, na qualidade de terras públicas, são inalienáveis, indisponíveis e os direitos sobre elas imprescritíveis;
X — há compatibilidade entre a ocupação tradicional das terras indígenas e a tutela constitucional ao meio ambiente".
RE 1.017.365