DANCINHA DO TIKTOK, REDES SOCIAIS E DEMISSÃO POR JUSTA CAUSA
Atualmente há 157 processos envolvendo questões trabalhistas relacionadas a justa causa e a rede social TikTok, que se popularizou no Brasil e no mundo com o seu modelo de vídeos curtos, e que já conta com mais de um bilhão de usuários ativos globalmente.
Tal índice — que, aliás, cresceu 45% segundo pesquisa recente da Data Lawyer —, em parte, é reflexo de um novo momento cultural e de um redesenho das próprias mídias digitais — cujo apelo por formatos audiovisuais cresce e muda as dinâmicas de interação dentro de uma sociedade já hiperconectada.
Mas ele também acende o alerta tanto para que as empresas sejam mais claras a respeito de suas políticas sobre o compartilhamento de imagens e vídeos que, de algum modo, possam ferir a honra de empregadores/outros empregados; quanto para os riscos da dispensa com a perda da maior parte dos direitos trabalhistas, incluindo a multa de 40% do FGTS, seguro-desemprego, 13º salário e aviso prévio.
TikTok, mídias sociais e as justificativas para a justa causa
Os novos desafios que o ambiente digital impõe as relações trabalhistas que motivam desde advertências até as demissões por justa causa no mercado — e passam ainda por processos movidos por profissionais contra seus empregadores pelas mais diversas razões (da exposição não autorizada de imagem a casos de danos morais) —, decerto, não surgiram com o TikTok.
Com o movimento de massificação das mídias sociais, em uma rápida pesquisa, é possível encontrar diferentes casos relacionados, por exemplo, a posts ofensivos no Twitter envolvendo empresas; comprovação de caso de desídia após publicação no Facebook; apreensão para o pagamento de dívidas trabalhistas em virtude de postagens de bens de luxo no Instagram.
Dentro desse contexto, o problema não é, obviamente, o TikTok ou qualquer outra mídia social; mas o modo como as redes podem vir a ser utilizadas e que, em se tratando das relações trabalhistas, em alguns cenários há, de fato, elementos capazes de caracterizar a justa causa.
Em um caso julgado pelo Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região de São Paulo, por exemplo, uma auxiliar de enfermagem teve a justa causa mantida por simular, em vídeo para a rede, atos sexuais dentro de seu local de trabalho (um hospital) e em horário de expediente.
Já a 1ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 18ª Região de Goiás manteve a demissão por justa causa de um funcionário que postou vídeo no TikTok difamando outro colaborador da empresa.
E aqui convém repassar, brevemente, as razões possíveis para a justa causa segundo a CLT:
— Ato de improbidade;
— Incontinência de conduta ou mau procedimento;
— Negociação habitual por conta própria ou alheia sem permissão do empregador, e quando constituir ato de concorrência à empresa para a qual trabalha o empregado, ou for prejudicial ao serviço;
— Condenação criminal do empregado, passada em julgado, caso não tenha havido suspensão da execução da pena;
— Desídia no desempenho das respectivas funções;
— Embriaguez habitual ou em serviço;
— Violação de segredo da empresa;
— Ato de indisciplina ou de insubordinação;
— Abandono de emprego;
— Ato lesivo da honra ou da boa fama praticado no serviço contra qualquer pessoa, ou ofensas físicas, nas mesmas condições, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem;
— Ato lesivo da honra ou da boa fama ou ofensas físicas praticadas contra o empregador e superiores hierárquicos, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem;
— Prática constante de jogos de azar;
— Perda da habilitação ou dos requisitos estabelecidos em lei para o exercício da profissão, em decorrência de conduta dolosa do empregado.
No âmbito das redes sociais, há muitos exemplos de justa causa relacionados aos atos lesivos da honra de empregadores ou colegas de trabalho; mas, conforme observado anteriormente, atos de desídia ou improbidade também podem ser comprovados nas mídias, com postagens, fotos e vídeos sendo usados como provas em processos.
Combinando as regras do jogo
Mas o cuidado — e o bom senso — no uso das redes sociais não se restringe aos funcionários de uma empresa ou mesmo há atos isolados de superiores que, por exemplo, venham a usar indevidamente a imagem de um colaborador nas redes sociais.
Do ponto de vista organizacional, é importante que as empresas contem com códigos de ética e manuais objetivos que esclareçam, dentre outros pontos, sobre possíveis práticas nas mídias digitais que venham a ferir sua imagem/relação com trabalhadores e mesmo motivar a justa causa.
A ausência de uma orientação nesse sentido foi a justificativa utilizada por uma juíza da 57ª vara de São Paulo para demover a justa causa de uma funcionária que postou um vídeo no TikTok dentro da empresa. Segundo a juíza, também não "houve repercussão negativa [...] algo grave ou que teve grande alcance", sendo desproporcional, portanto, a demissão sem o pagamento dos devidos direitos trabalhistas da empregada.
Nesse sentido, nunca é demais combinar as regras do jogo. Recomenda-se ainda — a depender da gravidade do caso — a gradação das penalidades a um funcionário, uma vez que advertências ou mesmo a orientação de supervisores diretos pode ser suficiente para que o empregado adeque sua conduta segundo as normas da empresa.
Cada caso é um caso: ou, mais propriamente, cada dança é uma dança. Convém que ambos — empregados e empregadores — acertem os passos e evitem tropeços.