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CONSEQUÊNCIAS DA DECISÃO DO STF SOBRE A LEI DOS MOTORISTAS

Recentemente, o Supremo Tribunal Federal (STF) concluiu o julgamento da ADI 5.322, proposta pela Confederação Nacional dos Trabalhadores em Transporte contra a Lei 13.103/15, que regulamenta a profissão de motorista profissional. Dos inúmeros temas questionados, quatro foram considerados inconstitucionais, mas trazem grande impacto econômico e social.

Em apertada síntese, concluiu a Suprema Corte que o aguardo nas operações de carga e descarga ou nas filas para fiscalização de mercadorias não será mais considerado tempo de espera, nem pago de forma indenizada à razão de 30% da hora normal. Com a decisão, tal período deverá ser considerado como jornada regular de trabalho e, desta forma, pago.

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Não poderá, da mesma forma, haver acúmulo do descanso semanal remunerado nas jornadas de longa distância, com possibilidade de gozo no retorno do motorista à sua base e residência, de forma a aproveitar o tempo com os familiares. O descanso semanal remunerado deverá ser aplicado da mesma forma que para outras categorias e obrigará os motoristas em viagens longas a parar em postos de serviço.

Os intervalos interjornadas também não poderão ser fracionados para viabilizar o encurtamento da viagem e a diminuição do seu custo. Dessa forma, após a decisão, as 11 horas deste intervalo deverão ser cumpridas integralmente e de uma única vez, desprezada as peculiaridades da rotina de trabalho dessa diferente categoria profissional. A Lei 13.103/15, portanto, não alterou a quantidade de descanso, mas possibilitou apenas a mudança dos momentos de sua concessão. Essa flexibilidade permitiu que os motoristas organizassem melhor a viagem e, com isso, reduzissem seu tempo de percurso, retornando mais cedo e com segurança às suas casas.

Se o motorista repousa por oito ou nove horas e se restabelece fisicamente para seguir a viagem, não precisaria ficar parado por outras duas ou três horas, a aguardar o horário para nova partida. Tomada por base uma viagem hipotética de seis dias, o motorista chegaria a ganhar entre 12 e 18 horas. Cuida-se de precioso tempo que poderia ser dedicado ao convívio social, familiar e ao lazer.

Por fim, não será mais permitido que, em viagem com dois motoristas, (caminhão com cabine), um deles repouse (sem computo na jornada) enquanto o outro conduz. A partir de agora, mesmo durante o repouso com o veículo em movimento, o período deverá ser considerado como de trabalho.

Essas questões terão impacto, direto e indireto, na geração de empregos, na arrecadação de tributos e no tempo para a entrega das mercadorias, reflexo também de natureza retroativa do julgamento do mérito da ADPF no período imprescrito das relações de trabalho dos motoristas profissionais. Tais aspectos afetam não apenas o setor produtivo, mas o setor de serviços e toda a sociedade brasileira, haja vista que o modal mais utilizado para transporte de cargas é o rodoviário  mais da metade das cargas transportadas no país ocorre dessa forma.

Acaso mantido o entendimento firmado pelo STF, o reconhecimento da inconstitucionalidade trará, entre outras consequências, a necessidade do aumento do número de equipamentos devido ao aumento do tempo de ciclo, o aumento do número de motoristas e a imprevisibilidade na gestão de ciclo de transporte, reduzindo a produtividade no segmento com aumento de custo.

Tais pontos não poderão ser atendidos com a rapidez necessária: há necessidade de alteração dos procedimentos internos, reorganização das jornadas e escalas, realinhamento de custos e contratação de novos motoristas. Todavia, novas admissões representam um problema extra grave: o número de motoristas acumulou queda de 22% nos últimos 9 anos, conforme nota [1] publicada pelo Sindicato das Empresas de Transportes de Carga de São Paulo e Região. No mesmo sentido, foi a manifestação [2] feita pela Confederação Nacional dos Transportes (CNT), que custeia a carteira de motorista profissional, das categorias D e E, para aqueles que se interessarem, em razão da dificuldade em se encontrar motoristas.

O fato é que a categoria se organizou, investiu e estruturou o modal firme nas premissas legais que vigoram por oito anos e que trouxeram aos próprios motoristas melhor qualidade de vida, já que a organização do labor privilegiava a redução da duração das longas viagens e facilitava o retorno antecipado para casa.

Nesse sentido, a norma brasileira não destoava do padrão adotado em outras partes do mundo. A exemplo, podemos citar o Regulamento CE 561/2006 da União Europeia [3], que, da mesma forma como previsto na Lei 13.103/15, permite o fracionamento do intervalo interjornada e a acumulação do repouso semanal remunerado, por exemplo. Assim, a norma brasileira parecia não comprometer a segurança viária e tampouco aumentar os riscos inerentes ao trabalho, violando normas de saúde, segurança e higiene laboral.

O fato é que a decisão proferida pelo Supremo, apesar dos detalhados votos, deixa algumas incertezas e preocupações, como o marco temporal de sua aplicação. Não esclareceu, por exemplo, como e quando deverão as empresas se enquadrar, o que pode trazer acentuados e graves efeitos econômicos ao setor e pôr em risco a dimensão objetiva da segurança dos negócios.

Com efeito, a necessidade de modulação, para garantir a segurança jurídica, é imperiosa. Tanto que os embargos de declaração opostos pela autora e pela CNT, em conjunto, e pela PGR, requereram a modulação dos efeitos a partir da publicação da decisão (12/7/2023), a fim de afastar a incidência de passivo trabalhista.

A CNI também opôs embargos à decisão, nos quais postulou uma modulação mais elástica, para que a decisão surta efeitos somente dois anos após o trânsito em julgado. A bem da segurança jurídica e rodoviária, é preciso que haja prazo de adaptação ao julgado até para que motoristas e cargas sejam adequadamente hospedados e alocados nas estradas, com tempo suficiente para destinação dos expressivos investimentos necessários para manter a produtividade e o escoamento em níveis atuais, reorganizando-se a logística em todos os setores econômicos ligados ao transporte de cargas.