STF JULGA QUEM DEVE GERIR RECURSOS DE TRANSAÇÃO PENAL E SUSPENSÃO CONDICIONAL
O Plenário do Supremo Tribunal Federal retomou, na última sexta-feira (10/5), o julgamento no qual se discute quem é o responsável pela gestão de recursos obtidos por meio de transações penais e suspensões condicionais do processo.
O Judiciário tem regras internas que atribuem tal função aos próprios Juízos da execução da pena, mas isso é contestado pelo MP. A análise virtual se estende até sexta-feira (17/5).
Três ministros já se manifestaram. Dois deles disseram que as normas do Judiciário sobre o assunto são legítimas, enquanto o relator as invalidou.
Contexto
O debate é quanto ao uso de recursos obtidos em casos de prestação pecuniária aplicada como condição para a transação penal ou para a suspensão condicional do processo.
Na transação penal, o réu e o Ministério Público fecham um acordo para cumprir determinadas condições estipuladas pelo próprio MP, em troca do arquivamento do processo.
Já na suspensão condicional, também proposta pelo MP, o réu aceita cumprir algumas condições impostas pelo juiz. O processo é suspenso até que elas sejam cumpridas e depois é extinto.
Por meio de ação direta de inconstitucionalidade, a Procuradoria-Geral da República questiona uma resolução do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e outra do Conselho da Justiça Federal (CJF), que determinam o depósito de valores relacionados a esses dois mecanismos na conta judicial da unidade responsável pela execução pena.
A PGR aponta que o Ministério Público é o único que pode propor suspensão condicional do processo e transação penal. Por isso, o Judiciário, que tem apenas o papel de homologar, não poderia definir o destino de valores relacionados a essas hipóteses.
Para a PGR, os conselhos do Judiciário excederam seu poder regulamentar ao estabelecerem regras sobre funções institucionais do MP e a atuação de seus membros.
O órgão ainda ressalta que a União tem competência privativa para legislar sobre Direito Penal e Processual.
Em 2021, durante uma sessão presencial relativa ao caso, o então procurador-geral da República, Augusto Aras, defendeu que o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) teria mais legitimidade para regulamentar a destinação desses recursos.
Segundo ele, os pagamentos, quando não direcionados às vítimas ou a seus dependentes, devem ser destinados a entidades públicas ou privadas com fins sociais ligados à segurança pública, à educação ou à saúde.
Voto do relator
Quando a ação começou a ser analisada, em 2020, o relator, ministro Marco Aurélio, declarou que a resolução do CJF é incompatível com a Constituição e estabeleceu que a resolução do CNJ não alcança o uso de verbas fixadas como condição para suspensão condicional de processo ou transação penal.
Embora o magistrado tenha se aposentado no ano seguinte, seu voto permanece válido na sessão atual.
Em seu voto, Marco Aurélio destacou a competência exclusiva da União para legislar sobre Direito Penal. Para ele, “órgãos estritamente administrativos”, como o CNJ e o CJF, não podem “dispor sobre matéria penal”.
Divergência
O ministro Kassio Nunes Marques divergiu do relator e validou as duas resoluções. Ele já foi acompanhado por Alexandre de Moraes.
Para Nunes Marques, o Judiciário deve administrar o cumprimento de medidas alternativas à prisão, como as prestações pecuniárias, justamente porque é o responsável por administrar o cumprimento da pena de prisão. Essa função inclui a definição da entidade que vai se beneficiar do dinheiro.
“Por falta de previsão constitucional, não cabe mesmo ao Ministério Público administrar nem disciplinar o destino de recursos que ingressam nos cofres públicos a título de sanção criminal, ou de sucedâneo desta”, assinalou o ministro.
Segundo ele, o MP não poderia definir, por exemplo, o estabelecimento prisional onde um condenado deve cumprir pena.
Da mesma forma, não pode definir a entidade beneficiária dos recursos de prestações pecuniárias, “sem que isso signifique efetiva ingerência na administração do cumprimento de uma tal medida alternativa”.
Na sua visão, as resoluções questionadas pela PGR se limitaram a “regulamentar o exercício de uma competência própria do Poder Judiciário, buscando sua uniformização nos tribunais pátrios”.
Por fim, Nunes Marques explicou que a administração do cumprimento das prestações pecuniárias não é tema de Direito Penal ou Processual Penal, mas sim de “regulamentação administrativa”. Por isso, concluiu que não há violação da competência legislativa privativa da União.