STJ NÃO PROIBIU, NEM DIFICULTOU USO DE RELATÓRIOS DO COAF EM INVESTIGAÇÕES
Ao vetar a requisição de relatórios de inteligência financeira (RIFs) ao Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) sem autorização judicial prévia, a 3ª Seção do Superior Tribunal de Justiça não proibiu, nem dificultou o uso desse tipo de informação.

Ministros esclarecem que STJ não vetou, tampouco dificultou, requisições a informações do Coaf
O recado é dos ministros das turmas criminais que compuseram a maioria vencedora no julgamento de quarta-feira (14/5).
“O que estamos discutindo aqui é se a produção desses relatórios deve passar por autorização judicial. Ninguém está impedindo que ele venha a ser produzido. É só para estabelecer um controle”, disse o ministro Sebastião Reis Júnior.
Ele diz não entender o motivo da resistência à obtenção de autorização judicial. “As informações estão todas lá no Coaf. Se vai demorar uma semana, mais ou menos, elas não vão se alterar. Não há emergência. Os dados serão acessíveis.”
O ministro Reynaldo Soares da Fonseca apontou que a reserva de jurisdição não desmerece a atuação dos órgãos investigadores. “Nenhum juiz brasileiro negará a autorização judicial para o Ministério Público ou a polícia em casos como os descritos hoje (quarta-feira).”
Coaf no combate ao crime
A fala faz referência à sustentação oral do procurador-geral da Justiça do Rio de Janeiro, Antonio José Campos Moreira, que citou a importância da investigação patrimonial no contexto de uma sociedade em que serviços públicos são tomados por facções e milícias.
O uso de relatórios de inteligência financeira permite não apenas a investigação e prevenção desses crimes, mas também a identificação de valores a serem confiscados na ação penal, disse Moreira.
A decisão da 3ª Seção não impede que isso aconteça, mas exige que o pedido dessas informações passe pelo crivo judicial. Quando é o Coaf que identifica a possibilidade de crimes e, de ofício, avisa MP ou delegados, o compartilhamento direto continua legal.
Isso ao menos até que o Supremo Tribunal Federal uniformize a própria jurisprudência. No momento, há uma divisão interna na corte, como mostrou a revista eletrônica Consultor Jurídico, que pode ser solucionada em breve.
Risco de abusos
Luiza Oliver, sócia do escritório Toron Advogados, avalia que a decisão da 3ª Seção é primorosa ao reafirmar a compatibilidade entre a efetividade da persecução penal e as garantias constitucionais.
“A obtenção dos RIFs junto ao Coaf segue sendo permitida, como sempre foi. Basta que o pedido seja feito ao Judiciário para análise prévia. Havendo motivos justos, os dados são compartilhados. Evita-se abusos, arbítrios e desvios. As investigações ganham com isso e, mais importante, a sociedade ganha também”, afirma.
Responsável pela defesa em um dos processos julgados no STJ, ela chamou a atenção, na sustentação oral, para esse aspecto prático da questão: pelos RIFs, os investigadores têm acesso indiscriminado a informações financeiras sigilosas.
“A realidade está batendo à porta”, disse a advogada ao citar uma reportagem da ConJur que mostrou que, em dez anos, o número de RIFs produzidos pelo Coaf a pedido de MPs e delegados aumentou 1.300%.
Insegurança até o STF decidir
Na mesma linha, a advogada Ilana Martins Luz, sócia do Martins Luz & Falcão Sande Advogados, destacou que a questão continuará gerando insegurança até que o Supremo firme posição unificada, mas sem prejudicar MPs e polícias.
“Isso não implica, por si só, o trancamento de investigações ou ações penais, uma vez que será necessário avaliar, em cada situação, se existem outras provas autônomas e válidas que sustentem a persecução penal.”
Para Fernando Hideo, advogado criminalista sócio do Warde Advogados, o tema escancara problemas crônicos da Justiça brasileira, como insegurança jurídica, casuísmo e instabilidade jurisprudencial.
“O resultado é um ambiente de incerteza que fragiliza tanto os direitos fundamentais quanto a própria efetividade da investigação criminal. Embora seja uma tarefa imprescindível, não se trata apenas de definir o que pode ou não pode o Estado. Trata-se, principalmente, de assegurar previsibilidade às regras do jogo, especialmente quando lidamos com direitos fundamentais e garantias individuais como a intimidade, o sigilo bancário, a licitude das provas e a integridade das investigações criminais.”