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VALIDADAS PELO STJ, RESTRIÇÕES AO PERSE CRIAM PROBLEMA CONCORRENCIAL

As restrições legais para ingresso no Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse), validadas recentemente pelo Superior Tribunal de Justiça, geram um problema concorrencial devido à forma como foram criadas.

Tomaz Silva/Agência Brasil

Desobrigados do Cadastur, bares e restaurantes foram os principais impactados pela restrição legal de aproveitamento do Perse

A opinião é de advogados ouvidos pela revista eletrônica Consultor Jurídico, em relação ao julgamento da 1ª Seção do STJ, na semana passada. O colegiado fixou teses vinculantes sobre o tema.

Ficou confirmado que apenas as empresas previamente inscritas no Cadastur podem usufruir do Perse. E que o contribuinte inscrito no Simples Nacional não tem esse direito, considerando a vedação legal para que gozem de benefício fiscal.

 

O Cadastur é um sistema criado pela Lei 11.771/2008 e gerido pelo Ministério do Turismo como ferramenta para formalizar e legalizar os serviços da área. Para algumas atividades, o registro é obrigatório. Para outras, como bares e restaurantes, é facultativo.

Essa diferenciação, que foi prevista primeiro pela Portaria ME 7.163/2021, do Ministério da Economia, é o que explica que parte dos potenciais beneficiários do Perse hoje se vejam impedidos.

A portaria foi editada porque seria necessário elencar quais ramos do setor de eventos seriam elegíveis para aproveitamento dos benefícios — tais como os CNAEs (Classificação Nacional das Atividades Econômicas).

Até aquele momento, a Lei 14.148/2021 previa renegociação de dívidas tributárias e não tributárias, mas sem a isenção de tributos (PIS, Cofins, IRPJ e CSLL) pelo prazo de 60 meses, conforme previsto inicialmente.

 

O artigo 4º da lei havia sido vetado pelo presidente Jair Bolsonaro (PL). Em março de 2022, o Congresso derrubou o veto e consolidou o cenário que criaria esse problema concorrencial.

Condições do Perse

Gustavo de Carvalho, coordenador da área de Direito Tributário do Fragata e Antunes Advogados e presidente da Comissão Especial de Assuntos Tributários da OAB-Niterói (RJ), diz que a exigência do Cadastur comprometeu a competitividade de empresas desobrigadas da inscrição.

“A consequência financeira é evidente e expressiva, já que essas empresas perderam a oportunidade de reduzir drasticamente sua carga tributária, durante 5 anos, em um momento de grande fragilidade econômica”, avalia.

Na mesma linha, Luiz Henrique Garcia Chaves, advogado tributário na Innocenti Advogados, ressalta que a exigência do Cadastur não estava na redação original da lei. “Tal exigência pode gerar conflitos concorrenciais, uma vez que as empresas beneficiadas poderão praticar preços melhores do que os concorrentes sem os benefícios fiscais.

A advogada Larissa Di Stefano, do contencioso tributário do VBD Advogados, diz que isso fere o princípio da isonomia, impedindo que empresas, que até então não eram obrigadas a ter esse cadastro para exercício de sua atividade, usufruam do benefício fiscal.

“Uma obrigação acessória não pode ser condicionante para aproveitamento de um benefício que tem como finalidade proteger as empresas que sofreram com a crise da pandemia”, aponta.

Linha do tempo legislativa

A 1ª Seção do STJ pôde validar as restrições ao ingresso no Perse porque elas se tornaram legais com a edição da Lei 14.592/2023. A norma listou as CNAEs elegíveis para aproveitamento dos benefícios e legalizou a exigência do cadastro no Cadastur

Posteriormente, a Lei 14.859/2024 mudou a redação do parágrafo 5º, do artigo 4º da Lei 14.148/2021, ampliando o acesso ao Perse a quem se cadastrou no Cadastur no período entre 18 de março de 2022 e 30 de maio de 2023.

 

Foi essa mesma lei que determinou que o Perse, com duração prevista até março de 2027, seria suspenso quando o valor total das isenções atingisse R$ 15 bilhões, teto que foi alcançado em março de 2025.

A revogação antecipada tem motivado centenas de ações judiciais de contribuintes apontando violação ao artigo 178 do Código Tributário Nacional. Em algumas delas, as decisões têm determinado a manutenção dos benefícios, o que também impacta a esfera concorrencial.

Para os tributaristas ouvidos pela ConJur, esse é um tema que pode salvar os efeitos pretendidos pelo legislador quando da criação do Perse.

Revogação antecipada

Luiz Henrique Garcia Chaves avalia que a maioria das decisões liminares favoráveis aos contribuintes vem acolhendo os pedidos para aplicação do princípio da anterioridade anual para o IRPJ e anterioridade nonagesimal para CSLL, PIS e COFINS.

“Assim, está se consolidando um cenário que, caso seja mantida a revogação antecipada do Perse, faz-se necessário respeitar o princípio da anterioridade, entendimento que pode ser consolidado pelos Tribunais Superiores.”

Larissa Di Stefano entende pela impossibilidade da revogação antecipada do programa, como medida de preservar os princípios da legalidade e segurança jurídica. “Essa revogação repentina em 2025 afeta drasticamente essas empresas, que não poderão usufruir do benefício até o final do ano e nem revisar o regime de tributação anual para Simples Nacional.”