SUPREMA CORTE DOS EUA ESCLARECE REGRAS PARA SENTENCIAR VIOLADORES DE 'SUPERVISÃO PÓS-PRISÃO'
A Suprema Corte dos EUA decidiu que casos de violação de “supervisão pós-prisão” estão na esfera da justiça restaurativa – não da justiça retributiva.
Isto é, ao sentenciar o réu por esse motivo, o juiz não deve levar em conta a gravidade do crime, nem outros fatores e circunstâncias pelos quais o réu foi originalmente condenado. Em vez disso, deve aplicar medidas que levem à reabilitação. Ou seja, o juiz deve olhar para o futuro do réu, não para o passado.
Nos EUA, os juízes têm um instrumento extra para lidar com as penas que aplicam aos réus. Como no Brasil, existe a figura da “probation” (suspensão condicional da execução da pena – ou sursis) e a “parole” (livramento condicional, após cumprir, com bom comportamento, parte da pena).

Pena para violação da supervisão pós-prisão deve focar na reabilitação do réu
Mas existe também a figura da “post-prison supervision” (supervisão pós-prisão), também chamada de “supervised release” ou “post-release supervision”: é uma sentença que o juiz aplica ao réu condenado, depois que ele cumpre sua pena de prisão. Normalmente, tem um período maior do que a pena de prisão, com o objetivo de monitorá-lo e ajudá-lo a se reintegrar na sociedade, para evitar reincidências.
A parte do monitoramento não agrada, obviamente, o réu, que sai da prisão mas continua devendo ao estado. Ele tem de cumprir condições, incluindo a se apresentar a um supervisor regularmente. Mas a parte da ajuda é interessante. O sistema lhe dá apoio para conseguir emprego, treinamento, moradia, tratamento de saúde e outros serviços essenciais. Já se comprovou que ex-prisioneiros, sob livramento supervisionado, têm mais facilidade para conseguir emprego.
Mudança positiva
Até a decisão da Suprema Corte, em Esteras v. United States, a situação foi pior para ex-prisioneiros que violam as regras da supervisão pós-prisão. Foi o caso, por exemplo, do autor da ação examinada pela Suprema Corte, Edgardo Esteras, de Ohio, nos EUA. E de dois outros ex-prisioneiros, também de Ohio, cujos processos foram consolidados pela corte.
Esteras foi condenado a dois anos e três meses de prisão por tráfico de drogas, antes de iniciar um período de seis anos de livramento supervisionado. Mas, em 2023, ele foi preso por posse de arma, o que configurou uma violação dos termos e condições dessa espécie de liberdade vigiada. A juíza Benita Pearson o condenou a mais dois anos de prisão e somou mais três anos a seu período de livramento supervisionado.
Juízes federais de primeira instância aplicaram aos ex-prisioneiros penas duras, mantidas pelos tribunais federais de recurso, porque levaram em conta os mesmos fatores que examinam ao sentenciar um réu no julgamento em que foi inicialmente condenado, como gravidade do crime, antecedentes, etc.
Não é assim que deve funcionar, diz a decisão da Suprema Corte, por 7 votos a 2, escrita pela ministra Amy Coney Barrett. “O juiz dispõe de ferramentas para aplicar ao réu a punição que ele merece, como a de prisão, pelo crime original. Mas, em contraste, a supervisão pós-prisão não é uma punição à semelhança do encarceramento”.
“O Congresso excluiu a retribuição, ao definir os fatores a serem considerados na supervisão pós-prisão. Assim, quando o réu viola as condições de seu livramento supervisionado, faz sentido que o juiz considere os propósitos futuros da sentença (dissuasão, prevenção e reabilitação), mas não considere o propósito retrospectivo da retribuição”, escreveu a ministra.
Apesar de o Congresso ter omitido a retribuição, nesse caso, os advogados do estado perguntaram à Suprema Corte se um juiz federal pode, a sua discrição, considerar alguns fatores que orientam a sentença, tais como gravidade do crime, respeito à lei e punição merecida.
A ministra Amy Barrett escreveu que esse não é o caso. “Não há razão para considerar os tipos de fatores disponíveis para se aplicar uma sentença, porque o livramento supervisionado é a única matéria em questão”.
Para a ministra, há outras medidas a serem consideradas, tais como terapia de controle da raiva, cursos para pessoas que lutam contra a dependência de drogas e de bebidas alcoólicas, programas de tratamento mental, treinamento de formação profissional e outros, que ajudam a evitar a reincidência.
Os ministros Samuel Alito e Neil Gorsuch foram os votos dissidentes. Alito declarou que a decisão da maioria desafia o bom senso. “Um juiz precisa analisar se o crime da pessoa condenada foi sério o suficiente para mandá-lo de volta à prisão”. Gorsuch argumentou que a lei não menciona retribuição entre os fatores a serem analisados, mas também não proíbe o juiz de levá-la em consideração.