COM ECONOMIA LENTA E DÓLAR ELEVADO, MULTINACIONAIS AMPLIAM AMORTIZAÇÕES
Em 2015, empresas nacionais optaram por direcionar mais recursos para pagar dívidas com matrizes ou filiais no exterior; opção foi mais atraente que o investimento em produção no País
São Paulo - Sem a previsão de melhora para a economia do País e com medo da desvalorização do real, as multinacionais brasileiras aumentaram em 60% os pagamentos de dívidas com filiais ou matrizes no exterior durante o ano passado, segundo o Banco Central (BC).
Depois de ficarem em US$ 24,852 bilhões em 2014, as amortizações intercompanhia chegaram a US$ 39,869 bilhões em 2015. O movimento foi causado, principalmente, pela queda do real no ano passado.
"O que aconteceu foi uma leitura antecipada de que a alteração do câmbio dificultaria enormemente os pagamentos", explicou Adriano Gomes, professor de administração da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM). "A ordem foi quitar rapidamente as posições que estavam indexadas ao dólar. Se isso não fosse feito, as empresas teriam muita dificuldade para liquidar as dívidas após a alta [da moeda]", complementou o especialista.
Já Ricardo Balistiero, professor de administração do Instituto Mauá de Tecnologia, ressaltou que o aumento das amortizações também está relacionado à recessão econômica no País. "Como a crise segue no Brasil, a ideia das empresas tem sido evitar uma volatilidade muito forte do seu endividamento, se trata de um movimento preventivo neste momento".
Gomes concluiu a linha de raciocínio. "As empresas tinham duas opções, quitar dívidas ou investir. Com a atividade econômica fraca, a escolha foi por quitar dívidas".
IOF
A redução do Imposto sobre operações de crédito, câmbio e seguro, ou relativo a títulos mobiliários (IOF), realizada em 2011, também teria afetado as amortizações. De acordo com Luís Afonso Lima, diretor presidente da Sociedade Brasileira de Estudos de Empresas Transnacionais e da Globalização Econômica (Sobeet), os empréstimos intercompanhia aumentaram após a diminuição da alíquota do tributo. Assim, o passivo das companhias cresceu nos últimos anos, trajetória acompanhada também pelas amortizações.
Entretanto, os empréstimos intercompanhia recuaram em 2015, "porque a volatilidade cambial tirou a vantagem para a captação e levou a uma diminuição destas transações", apontou Lima.
No ano passado, o montante que chegou ao Brasil via empréstimos intercompanhia foi de US$ 58,552 bilhões, queda de 9% ante os US$ 63,828 bilhões registrados em 2014.
Setores e países
O setor industrial realizou grande parte das amortizações feitas no ano passado, sendo responsável por US$ 21,3 bilhões das operações, alta de 87% na comparação com 2014.
Segundo Lima, o domínio da indústria também se deve à atividade econômica. "O setor tem sido o mais prejudicado pela conjuntura e faz sentido que seja também o que mais remete capital para o exterior. Esses recursos podem, inclusive, ser usados para investimento em outros países."
Os ramos da indústria que mais gastaram com amortizações no ano passado foram produtos químicos (US$ 4,005 bilhões, alta de 52%) e veículos automotores, reboques e carrocerias (US$ 3,487 bilhões, aumento de 102%).
Também foram registrados aumentos nas amortizações realizadas pelos setores agropecuário e de serviços. O primeiro chegou a US$ 7,083 bilhões (+40%), o segundo, a US$ 11,486 bilhões (+37%).
A lista dos destinos que mais receberam as amortizações tem Países Baixos na primeira posição. No ano passado, US$ 7,959 bilhões foram enviados por empresas brasileiras para os holandeses. A liderança de uma nação de menor poder econômico foi explicada por Lima: "Holanda, Suíça e outros países apresentam benefícios tributários para esse tipo de transação. Assim, um investidor de outro lugar pode usar a Holanda como intermediário". A Bélgica (US$ 4 bilhões) ocupou a segunda posição.