LEI DA DOMÉSTICA COMPLETA TRÊS ANOS, MAS INFORMALIDADE E JUDICIALIZAÇÃO SÃO DESAFIOS
O emprego doméstico no Brasil registra crescimento da informalidade, aumento no número de trabalhadoras mais velhas, com faixa etária superior a 50 anos, e elevação do grau de instrução da categoria. Esse é o retrato dos três anos desde a entrada em vigor da Lei 150/ 2015 ou Lei da Doméstica, que reconheceu a atividade como profissão e regulamentou os direitos dos trabalhadores, como férias, 13º, FGTS e seguro-desemprego.
Segundo estudo da ONG Doméstica Legal, com base em dados da Pesquisa por Amostra de Domicílio (Pnad), do IBGE, houve aumento de 23,22% no número de diaristas, entre 2015 e 2018, passando de 1,5 milhão para 1,8 milhão. Ao todo, segundo a Pnad mais recente, são cerca de 6,2 milhões de trabalhadores domésticos hoje no país, mas a taxa de empregados com carteira assinada recuou de 32% para 30%.
A vice-presidente do Sindicato das Domésticas no Rio, Maria Isabel Monteiro, ressalta que a conscientização sobre seus direitos foi o grande benefício da lei:
- Ainda temos um longo caminho pela frente, mas avançamos. A despesa fica maior se não cumprir a lei.
Para Mário Avelino, presidente do Doméstica Legal, a lei trouxe avanços relevantes:
- O emprego doméstico era um subemprego, sem direito à jornada de trabalho, sem hora extra, direitos que foram conquistados.
O coordenador de Trabalho e Rendimento do IBGE, Cimar Azeredo, alerta que a perda de postos formais na categoria atribuída não se deve ser somente à Lei 150:
- A crise afetou a categoria tanto quanto o suposto aumento de custo do empregador, gerado pela regulamentação da profissão. Um milhão de empregadas quer trabalhar mais horas, mas está subocupada por não conseguir mais trabalho.
VENDAS PARA COMPLEMENTAR A RENDA
Há 18 anos atuando como cuidadora de idosos, Josiane Muniz Lima, de 51 anos, trabalhava com carteira assinada, mas logo depois da lei para evitar a formalização, o patrão decidiu que ela trabalharia duas vezes por semana, revezando em turnos com outras duas pessoas.
- Ganho R$ 1.200, sem benefícios. A passagem e o almoço, eu tiro do meu bolso. Minha renda mensal caiu muito desde a aprovação da lei. Antes, trabalhava os cinco dias da semana e recebia R$ 3.500 - contou Josiane, acrescentando que, para complementar a renda, vende roupas e artesanato na internet.
Já Inês Aguiar Barbosa da Silva, de 57, trabalha há quase 30 anos como diarista, mas reclama que o volume de contratação caiu:
- Era mais fácil. Hoje em dia o serviço está escasso.
INSEGURANÇA JURÍDICA É PREOCUPAÇÃO
A entrada em vigor da Lei das Domésticas, além da promessa de formalização, também criou a expectativa de oferecer mais segurança jurídica a patrões e empregados. A advogada Juliana Bracks, do escritório Bracks Advogados Associados, observou aumento da preocupação dos empregadores com o contrato de trabalho e com o sistema da Receita Federal que unificou a arrecadação das contribuições trabalhistas e previdenciárias através do eSocial.
- Aumentou a profissionalização da categoria, com empregados e empregadores conhecendo mais os seus direitos. Embora a preocupação tenha crescido, muitos casos ainda vão parar na Justiça, grande parte por pagamento verbas rescisórias de hora extra, dano moral, por tratamento grosseiro. Além disso, alguns empregadores fazem o chamado pagamento por fora. Anotam um salário na carteira, para desconto dos encargos, e o resto pagam por fora.
No Sindicato dos Empregadores Domésticos do Estado de São Paulo (Sedesp), funciona uma câmara arbitral para solução de conflitos entre patrões e empregados antes que eles cheguem à Justiça do Trabalho.
- O aumento da judicialização gera insegurança jurídica para os empregadores. Buscamos sempre a conscientização das obrigações - explica Karla Resende, presidente do Sedesp.
Para o Sindicato das Empregadas Domésticas de São Paulo, a dificuldade de fiscalização é um dos grandes desafios.
- As situações de irregularidade só aparecem com denuncias - afirma Nathalie Rosário advogada do sindicato.
QUEDA NA CONTRIBUIÇÃO À PREVIDÊNCIA
Caiu a contribuição previdenciária, observa Cimar Azeredo, coordenador de Trabalho e Rendimento do IBGE: "O número de trabalhadoras domésticas que contribuem para Previdência Social chegou a 45%, entre 2012 e 2013, mas agora esse contingente caiu para 40%. Na realidade, a empregada não precisa ter carteira assinada para pagar o INSS, podendo contribuir como autônoma. O problema é que esse custo ela tem que absorver, em um salário que já é baixo. Esse peso fica com ela. Sem a contribuição previdenciária, ela não terá direito a auxílio-doença, em caso de afastamento, e salário maternidade pelo INSS, além de comprometer a sua aposentadoria no futuro."